quinta-feira, 30 de julho de 2009

UM TEXTO DIÁRIO, SEMANAL, MENSAL... OU DE VEZ EM QUANDO


AS NOSSAS BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA...(CAPÍTULO II)


Falar ou escrever textos sobre a nossa juventude, mais do que um exercício de saudade, é seguramente um desfile de memórias de alegria e de tristeza. Recordar, e fazer recordar às mulheres e homens da minha geração, as nossas brincadeiras, as nossas malandrices, os nossos sonhos, tentando também dar a conhecer aos jovens de hoje, como era fácil ser jovem nos anos quarenta e cinquenta, com o pouco a que tínhamos acesso, e como esse facto tem naturalmente de ser motivo de alegria e satisfação, para todos.

Os brinquedos, como referi em anterior texto, eram na sua maioria feitos por nós.

Os jogos que praticávamos, quase sempre inventados, eram propriedade de todos e não havia exclusividades. Direi que eram universais!Jogar à deserta, significava criar um "coito", normalmente numa parede balizada com duas varas, duas pedras e às vezes com os blusões ou outras peças de roupa. Do grupo, um ou dois ficava no "coito", para não permitir tocar a parede com a mão, metade corria a esconder-se e a outra metade a procurá-los, assim que se ouvisse o grito " à deserta ". Ganhava quem conseguisse atingir o "coito".

O jogo das Uvas, em regra era jogado encostado a uma parede, de preferência se a mesma tinha um pilarete em pedra. À sorte eram distribuídos os que ficavam dobrados pela cintura, com a chamada "mãe" segurando na cabeça do primeiro, e os outros saltavam, com a dificuldade acrescida conforme o tamanho do grupo que se sujeitava a receber os saltadores. Os primeiros, tinham de saltar bastante comprido, para permitir aos restantes "acomodarem-se" e aguentarem o mais possível em cima. Alteravam-se as posições, quando o grupo de cima ou o de baixo, gritava "arreamos".

A fisga, fabricada com uma forquilha em forma de V com uma haste, normalmente obtida nas romanzeiras, dois elásticos retirados das câmaras de ar das bicicletas, já impróprias para utilizar, e um bocado de sola de sapato ou do contraforte ( o qual representava o local ideal para obter este elemento), era a "arma" certa para ir aos pássaros: Calhaus redondos, que se apanhavam nas azinhagas, uma boa pontaria, as "flozinhas de mato" nos arbustos rasteiros, os "picanços" nos fios de telefone por cima dos milheirais, os "piscos" nos figueirais, e às vezes, no regresso uma lâmpada de candeeiro público, era ocupação para muitas horas. Ainda juntávamos a esta actividade (lúdica / desportiva), um ataque às arvores de fruto (quem não se lembra de ir à nêspera, também conhecida por "caracol amarelo"), ou apanhar umas boas corridas dos cães residentes nas hortas? Quantas vezes, corri à frente do cão existente na horta do meu avô - João do Carmo (Carminho) que ignorava a minha presença juntamente ao "bando de rapineiros de fruta"?

Acrescento ainda o jogo de "cowboys" em que o grupo se dividia sem discussão, em bandidos, sherifes e seus ajudantes. Pistolas feitas de madeira, cortiça ou a própria mão de dedo espetado funcionava como "arma". Escondíamo-nos e, espreitando nas esquinas dos prédios, quando se vislumbrava um "bandido", disparava-se o tiro e simultaneamente a voz de prisão. Quem recebia o tiro no peito, caía e dizia em voz alta " Estou morto!". Por vezes, e na ânsia de não ser apanhado, negava-se ter sido ferido, e lá vinha a frase característica do momento: "Se não morres, não brinco!". O jogo continuava até estarem todos presos ou mortos e ai, como hoje, os bons viravam maus e vice-versa.

Termino este capítulo com o "jogo" da velha linha preta, atada à mãozinha da parte fixa das portas: Em regra, as portas eram compostas por duas partes, uma fixa e outra que abria, pelo que, ao cair da noite, após o jantar e aproveitando o crepusculo, dava-se início ao "jogo": Empoleirados nas árvores, que existiam abundamente, puxava-se a linha que havia sido previamente atada à mãozinha e tocava-se à porta. A dona vinha abrir e não via ninguém e começava a ralhar: " Seus malandros, vão-se deitar e tenham juizo" e voltava a fechar a porta. Passados uns momentos, lá ia mais uma puchadela de linha... e a cena repetia-se até que a dona da casa, resolvesse e muito bem não "dar ouvidos". Voltarei para o capítulo III...se a inspiração e a memória continuarem a auxiliar.

Jorge Tavares

costeleta 1950/56
Recebido e colocado por Rogério Coelho

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Jorge Tavares
A ideia de relembrar o passado,
que o amigo Tavares com tantos
pormenores descreve, faz-nos revi-
ver momentos bons e saudáveis de
uma juventude que não tem regres-
so.
A nossa (a minha) geração
agora só precisa reviver o pas-
sado, recrear o espírito e ....
viver da saudade!
Parabéns Sr. Jorge Tavares e
obrigado pelo que nos oferece.

UM ABRAÇO DO MAURICIO