terça-feira, 1 de setembro de 2009

"DUETO"

Um conto de Alfredo Mingau

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O moço, de seu nome Delmiro da Silva, concluíra o Curso de Comércio na Escola Tomás Cabreira.
Fizera tudo na vida sem o apoio de ninguém. Os pais morreram num desastre de viação ainda ele era rapazote. Não conhecia família. Ganhava uns tostões a fazer recados e estudara de noite. Residia sozinho numa casita ali para os lados do “Chalé das Canas”.
Quando acabou o curso arranjou um emprego no escritório de um advogado situado na rua de Santo António.
Fora, como dizia, a única sorte que tivera na vida. Não tinha amigos e nunca conhecera uma namorada. Vivia só.
Naquele dia, de Inverno, saíra do emprego, já a entrar na noite. Deambulara pelo Jardim da Alagoa e foi caminhando na direcção do Largo de S. Francisco. Aquela hora já não se via vivalma, até porque chovia, caindo miudinha, mas que não o apoquentava. Os pensamentos sobrepunham-se. Parou junto da cancela da via-férrea, que estava fechada adivinhando-se a aproximação dum comboio.
Reparou num vulto que se encontrava junto à linha. Ficou preocupado e atento.
A automotora aproximava-se, apitando antes da passagem de nível. O vulto mexera-se e... foi tudo muito rápido com o Delmiro a saltar e agarrar naquela pessoa e puxá-la para fora dos carris. Abraçados caíram no empedrado da via-férrea. Pela fraca luz dos candeeiros reparou que era uma rapariga que chorava convulsivamente.
Meigamente perguntou-lhe como se chamava
- Anabela, respondeu.
- Os teus pais?
- Não tenho pais. Não tenho família. Perdi o emprego e não tenho dinheiro para viver, respondeu com a voz embargada pela comoção.
- Eu sou o Delmiro, vem comigo, disse-lhe.
Amparou-a e caminharam na direcção do “Chalé das Canas” que não ficava longe.
Sentou-a no pequeno sofá da salinha e, entretanto, colocou água num púcaro e fez um chá de “erva cidreira”.
Beberam os dois olhando-se. Sorriram. Conversaram.
- Eu também não tenho família, vivo só, confessou o Delmiro.
E com acanhamento disse-lhe
- Anabela, fica comigo...!
Setembro de 2009 - um conto de ficção
Recebido no mail da Associação e colocado por Rogério Coelho

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