terça-feira, 1 de setembro de 2009

UM TEXTO...DIÁRIO, SEMANAL, MENSAL...OU DE VEZ EM QUANDO

Jorge Tavares


AS NOSSAS FÉRIAS GRANDES....CAPÍTULO lV


Três dias de descanso e iguais dias para curar uma constipação de verão, mantiveram-me fora do escritório, local aonde disponho de melhores meios técnicos para me dedicar a escrever uma linhas para o nosso blogue. Esta ausência não foi, contudo, impeditiva de ler com interesse todos os escritos e comentários. Estou satisfeito. O blogue está vivo!

A questão que me coloco hoje e agora, na tentativa de prosseguir a minha colaboração com o blogue, é:

- Que tema abordar? Política? Definitivamente, não! Religião? Tampouco! Futebol? Ainda é cedo! Novas tecnologias? Dificilmente escreveria algo com interesse. Economia e Finanças? Teria alguma dificuldade em separar a técnica da política.. Cidade de Faro? Talvez para Outubro. Recordações da juventude? Agrada-me, sempre! E, porque as recordações são muitas, aí vai mais uma estória da juventude de então.

Quando completei 14 anos, o meu pai entendeu que as " férias grandes" deveriam ser passadas no Cerro do Alportel, local aonde tínhamos uma casa.O Cerro do Alportel situa-se na povoação do Alportel, a cerca de 4 quilómetros de S. Brás de Alportel, que é atravessada no sentido longitudinal pela EN2. Antes de continuar, e a título de curiosidade: São Brás de Alportel deve o seu nome, diz-se, ao facto do bispo - e hoje, Santo Padroeiro da vila, São Brás - querer permanecer na igreja do Alportel e na altura, teimosamente inisistirem em colocá-lo na Igreja Matriz de São Brás, "fugindo" ele de noite, para se voltar a instalar na "sua" igreja. Daí o nome São Brás de ALPORTEL.

Prosseguindo, o Cerro do Alportel é uma das colinas que rodeiam o Alportel, como outras de que são exemplo os Juncais, Moinho de Vento, Farrobo, Cerro da Pousada, etc.

Os nossos vizinhos mais próximos eram a família Sancho, os mais abastados da vila, com o seu solar dos princípios do século XX. Também o Henrique Faria, detentor dum rebanho de ovelhas ( algumas suas, outras de outros donos que lhas entregavam para pastar, recebendo ele em troca a lã e os queijos do leite que ordenhava), o Miguel, mais conhecido pelo Miguel dos porcos, porque dava pastorícia a cerca de 80 bácoros, propriedade da família Sancho. Alguns outros moradores, mas que não tiveram tanta influência nas minhas férias pelo Alportel. Vestindo uma calças de cotim ( tecido de que eram feitas as fardas da Polícia e da GNR ), botas fabricadas à medida, e reforçadas com cardas na sola - botas cardadas, era o seu nome - fisga no bolso, sacola com uma sandes de pão caseiro, banha e queijo de ovelha e boné na cabeça, respondia à chamada do Miguel, que me batia à janela do quarto ao nascer do sol.O pequeno almoço iniciava-se no figueiral existente no vale entre o Farrobo e São Romão, ouvindo as estórias que me contava o Miguel, enquanto a "ganhoa", assim se chamava a porca, obedecia a todos os chamamentos do próprio. Parece que ainda o ouço chamar " eh! ganhoa, roda, busca, etc". Com a sua funda ( que me ensinou a fazer utilizando baraço), o Miguel ia mandando umas pedras para evitar algum tresmalhe dos porcos. NUNCA alguma pedra atingia um animal, quer pela sua precisão, como pela sua preocupação. Dos seus ensinamentos, além da funda de cabreiro, aprendi também a fazer cajados, utilizando rebentos de oliveira aquecidos, forçando a dobra muito suavemente durante alguns dias, até ficar na sua posição final.

Outro meu companheiro foi o Henrique Faria. Homem bom, bebia o seu copinho, em regra numa taberna na Soalheira, povoação que ficava noutro vale (estrada que liga São Brás de Alportel a Loulé). Nas tardes em que os copitos ultrapassavam a medida, o meu amigo a qualquer hora da noite vinha para casa, porque as suas ovelhas o orientavam pelos caminhos e veredas.Com este homem aprendi a armar aos pássaros, com ratoeiras e esparelas, a caçar com a sua espingarda de carregar pela boca, apanhar e manter agudias, para que os piscos caíssem na ratoeira ao nascer so sol, quando as asinhas da formiga começavam a mexer. E de noite, a apanhar coelhos com os seus furões e a ver como ele em sua casa, os ensinava a caçar.Os meus tempos em férias completavam-se com outras actividades, nomeadamente, montar uma égua da Dª. Isabel Sancho, depois de lhe colocar as cangalhas para 4 cântaros de cobre, descer o Cerro, subir aos Juncais, atravessar a EN2 e ir até à fonte férrea encher os cântaros. A fonte tinha um muro que permitia o encosto do animal e consequentemente, que se tirasse e colocasse os cântaros com o mínimo esforço. Na época da apanha dos figos, munido de um "caímbo" * colaborava na sua apanha. Os figos eram depositados em esteiras de cana a secar ao sol, nas eiras ou varandas, durante algum tempo, para posterior classificação e venda conforme a sua qualidade. Igualmente, colaborava no varejo das alfarrobeiras e apanha das alfarrobas. As varas utilizadas no varejo, tinham vários comprimentos adaptadas à altura de cada árvore. Debaixo das alfarrobeiras eram colocadas serrapilheiras, para facilitar a apanha. Deste trabalho sempre vinham uns cobres, porque depois da apanha, rabiscavamos as sobras que restavam no chão ou ainda na árvore, e vendiamos no estabelecimento do "Pichoreto".Depois do jantar ( à luz do candeeiro a petróleo ), devidamente "aperaltado", descia até à povoação, para conviver com outros amigos e amigas, passeando pela estrada, jogando às cartas ou simplesmente, conversando. O grupo de raparigas e rapazes era grande, porque na altura a região era muito frequentada por pessoas oriundas de diversos sitios, que queriam "mudar de ares" e a escolhiam dada, a proximidade do Sanatório de São Brás e a qualidade do clima. A hora de recolha para a deita não podia ultrapassar ( para todos ) as 23 horas. Recordo com saudade e alguma surpresa, o facto de poder andar de dia ou de noite, ainda bastante jovem, sem quaisquer temores. De noite, por vezes escuro que nem "breu", surgia em sentido contrário um ponto vermelho: Alguém vinha fumando! Quando nos cruzávamos, e porque todos se cumprimentavam, ainda que não se conhecessem, o boa-noite era espontâneo. Tal e qual como agora....!!!!

Vou terminar por hoje. Fica no ar a promessa de continuar com muitas outras estórias duma juventude bem diferente, mas não menos interessante... *Tentei encontrar esta palavra nos manuais ao meu dispôr e na nett. Nada. Escrevi como ouvia e dizia na altura. Era uma vara de madeira, terminando em V e que servia para puxar a ramagem das figueiras, facilitando a apanha dos figos.

JORGE TAVARES

costeleta 1950/56

Nota: Descuidei-me e estendi o pé mais do que o lençol...prometo que o próximo será mais curto


Recebido e colocado por Rogério Coelho

5 comentários:

Associação Antigos Alunos Escola Tomás Cabreira disse...

Meu caro Jorge
Vê lá se me escreves uns textos mais pequenos ou, divididos em duas ou três partes.
Um abraço
Rogério

jorge tavares 1950/56 disse...

Meu presado Rogério,

Tens muita razão. Desta vez discuidei-me. Estava tão entusiasmado a escrever que ultrapassei as regras que eu próprio tinha imposto, ao tamanho dos textos.
O ensinamento que hoje recebi, quando falamos aop telefone, é excelente para resolver estas situações.
Um abraço

Jorge Tavares
costeleta 1950/56

Anónimo disse...

Caro Jorge Tavares

Um abraço
Mais uma bonita história . Parabéns.
Embora extensa li com muito agrado
todo o texto. Limitando a narração
perdiria a beleza da descrição e
o conhecimento de pormenores que
ela contém.
Continue Jorge. Este tema delicia
muitos Costeletas.

MAURÍCIO DOMINGUES

Anónimo disse...

Bom dia amigo Joao

Li, no nosso blogue, um artigo longo mas interessante escrito por Jorge Tavares que penso que e de Sao Bras e andou na nossa escola nos mesmos anos que nos andamos. Agradecia se tens o e-mail dele para eu comunicar com ele.

Obrigado e ate breve

Um abraco

F. Gabriel Cabrita

Anónimo disse...

Para F. Gabriel Cabrita,

Ai vai o meu email e o meu site. Contacta.

jctavares@jcarmotavares.pt.

www.jcarmotavares.pt

Um abraço

jorge tavares
costeleta 1950/56