domingo, 3 de abril de 2011


ILUSÔES (III)

Não pretendo fazer comparações de consentimento com quaisquer fazendeiros do nosso burgo. E muito menos com os montanheiros, que o Brito de Sousa não me leve a mal, ali dos Braciais.
O que é certo é que os ciganos precisam de bons terrenos para que o seu “trabalho” prospere. Têm que estar perto dos “clientes” e para isso precisam de descobrir campos de relva, de feno, de aveia ou de milho cortado a dois passos das respectivas cidades. Sem pedirem licença aos seus proprietários. Aqui, para terem comida para os seus animais, ali para se deslocarem com facilidade e tratar do seu “comercio na cidade”.
Numa manhã de Sábado resolvi visitar o José cuja morada se situa nos subúrbios e resolvi deslocar-me a pé apreciando os campos verdes de erva, sem nada semeado, uma lástima, verificando, antes de chegar a casa do José, um pequeno aglomerado de, chamemos assim, “favela cigana”.
Abri a cancela da propriedade do José e entrei naquele pequeno jardim, de certo modo florido, e reparei que o proprietário, de joelhos, podava umas roseiras.
- Bom dia José! posso entrar?
Respondeu com um resmungo, que percebi ser “já entrou” e acrescentou:
- Oiça, disse ele através do espaço que nos separava, “este mundo, e tudo o que nele existe, não passa de ilusões, Fernando! Desde as coisas mais íntimas – são tudo ilusões! Percebe o que eu quero dizer?
Não houve piscar de olhos nem sorrisos; como se de repente ficasse furioso comigo por eu não saber aquilo há mais tempo. Pensei, “a coisa promete” e respondi
- Sim, está bem, são ilusões, foi tudo o que eu consegui responder. Mas mudei de assunto e disse:
- José, você tem aqui próximo instalados novos vizinhos.
- Vizinhos? Isso é outra ilusão. Satisfazem a fome aos animais, roubam-me a água e, de repente desaparecem e noto depois que tudo o que é de ferro e cobre desapareceu também. Não será isto uma ilusão? Nómadas!
- De facto não deixas de ter razão mas, até ser ilusão…
- Fernando, respondeu. No livro que lhe emprestei está lá escrita esta máxima:

“É uma ilusão imaginar o universo belo, justo e perfeito”.

Conversámos sobre outros assuntos e, na hora do almoço, o José apontou-me o dedo e disse:
- Vou tratar do meu almoço e você, se quiser almoçar, vá para sua casa fazer o mesmo…
Despedi-me, desejando-lhe bom apetite, saí a cancela e ao mesmo tempo que pensava naquele à vontade, indelicadeza e falta de cortesia, dizia para os meus botões:

Isto é uma ilusão
Tudo o que se passou aqui pode estar errado


Montinho

Nota:- Não é falta de respeito falar dos montanheiros dos Braciais… senhor       JBS.
Mas se achar que é, peço-lhe perdão. ILUSÕES III a seu pedido.

5 comentários:

Anónimo disse...

CARO MONTINHO

Viva.

Venham ILUSÕES IV, V e seguintes.

Um ab.

JBS

jctavares@jcarmotavares.pt disse...

Meu caro João e todos os "montanheiros costeletas ",

Quem privou e priva com os denominados "montanheiros", sabe que jamais, nem mesmo ilusóriamente, um "montanheiro" mandaria sair um visitante da sua casa, porque ia almoçar.
Concerteza que o convidaria para faze-lo juntamente com ele.
Sou descendente de " montanheiros" pelo lado materno e deixo as ilusões para os ilusionistas e para os ficcionistas...embora sugerindo algum cuidado.

jorge tavares
costeleta 1950/56

Anónimo disse...

Criticando o comentário do Sr. Jorge Tavares.

Comentário infeliz para quem gosta de escrever bem.
Um historiador procura escrever a realidade da história/texto. O que não é o caso.
Um escritor escreve de uma forma geral, sem olhar à realidade. Muito do que escreve fá-lo com ficção.
Basta compreender o primeiro parágrafo do texto ILUSÕES III com atenção.
No seguimento do texto não é afirmado que o José é Montanheiro.
Montanheiros são aqueles que vivem num monte, com uma certa dimensão e/ou possuindo várias propriedades.
José vive numa pequena casa dos suburbios com um pequeno jardim. Não é um monte.
O autor entendeu escrever que o José não quiz convidar o Fernando para almoçar. Podia escrever o contrário. Qualquer escritor é livre de escrever sem receber lições de outrem.
Comentário infeliz.
Alfredo Mingau

jctavares@jcarmotavares.pt disse...

Comentário ao comentário do meu comentário...

Jamais pensei dar lições a outrem, particularmente aos escritores. Não tenho saber nem conhecimentos que me permitam essa "leviandade".
Talvez por deformação profissional, sou demasiado pragmático, e como tal entendo que a ficção tem sempre algo a ver com algum sentimento consentaneo com a realidade do tema escolhido.
Estarei errado? Talvez! Será porque gosto muito dos montanheiros?
A propósito, a denominação montanheiro, foi atribuida às pessoas que viviam nas hortas, fora do perímetro da cidade, até ao sopé da serra do Algarve. Assim me ensinaram.
jorge tavares
costeleta 1950/56

Anónimo disse...

Meu caro Jorge Tavares,
Também me assiste o direito de comentar/respondendo, uma vez que sou eu que estou na "berlinda".
A sua "procuração", chamemos-lhe assim e sem ofensa,a favor do "montanheiro" João Brito de Sousa e outros, pareceu-me tardia. O visado JBS, na sua leitura deste meu texto (ILUSÕES III), comenta dizendo "venham ILUSÕES IV, V e seguintes".
Posso estar errado, mas é a primeira vez que ouço chamar aos "hortelãos" montanheiros. Não discuto.
Todos os meus maiores "eram" montanheiros, e não viviam em hortas, mas na barroca interior a que vulgarmente se chama barrocal.
Se escrevi esta pequena série ILUSÕES, foi porque o prório JBS, depois de eu dar por terminado o meu contributo no blogue, me solicitar, pessoalmente,para continuar.
É muito fácil por ponto final aos comentários,como são feitos, a quem escreve com boas intenções e com o propósito de agradar.
Um abraço
Montinho
(Costeleta dos anos 40