terça-feira, 2 de agosto de 2011


O MEU AMIGO ANTÓNIO LOUREIRO
Por João Brito Sousa

 
Estive em contacto com o senhor António Loureiro, por acaso, ou melhor, falei com ele, porque me enganei no número de telefone quando tentava ligar a um outro. Liguei e surgiu no outro lado da linha, um cavalheiro bem disposto que me pareceu bastante lúcido, simpático e bastante falador. Tenho quase noventa anos, disse-me ele. E fui renovar a carta de condução hoje. E trouxe-a. Espere um pouco que fala com a minha mulher. E a senhora veio e perguntou-me quem era. Respondi, mas ficou na mesma, penso eu. Já não saio à rua disse-me a senhora. Mas lúcida q.b.
E por isso, numa homenagem à vida, valerá a pena falar deste casal de gente boa a rondar os noventa. Histórias para contar, tem? Nada, disse-me ele. Futebol ? Ia á bola? Grazina e Loulé, lembra-se ? Nada, não gosto de bola. Nasci no distrito de Viseu, estive em Angola e há trinta e cinco anos que estou aqui em Olhão, é mais quente sabe, eu gosto disto. Olhão tem grandes avenidas, bons jardins e boas lojas, tem o mercado, ou praça, vá, que é das melhores do Algarve, tem a festa do marisco e tem um bom Presidente da Câmara que é o Vital. Vital ? perguntei eu. Ah, não, desculpe lá, Engº Leal.
Nestas idades, não é muito fácil encontrar pessoas com este espírito positivo, no sentido de gostar da vida ainda, sabendo-se que o espaço de manobra é reduzido. Há muitos anos, um velho da minha terra, o Ti Manel Simão, disse-me: “já sei que muito tempo não posso durar”
António Loureiro nunca me falou disso. Falou como se nada estivesse para acontecer, sorria até, com um sorriso que me parecia de vencedor. Vendi pipocas á entrada das escolas, ao pé do mercado e em todo o lado. Tinha carrinha para o transporte do material e lá ia. E tenho automóvel também. E ando por aí.
Parecia-me um homem sem idade. O mesmo homem que trazia no bolso um bilhete de identidade que supostamente deveria ser o seu, mas que na verdade contrariava o que o espírito lhe afirmava ser impossível: quase noventa anos! A chamada terceira idade tem destas coisas, gente lúcida ainda, que gosta da vida encarando-a com a suavidade possível.
É interessante ouvir estas pessoas para quem está tudo bem, sem recriminações, nada exigindo da vida quando lhe deram tudo. Os velhos acreditam em tudo, as pessoas de meia idade suspeitam de tudo, os jovens sabem tudo, disse Óscar Wilde. Concordo. Deixo esta história dum velho, bastante elucidativa. Quando foi da colocação da estátua de D. José em cima da base em cimento, as cordas não davam mais e faltavam subir dois centímetros, por aí Perante isto, instalou-se o pânico, passou um velho e disse: Molhem as cordas. E a estátua foi colocada
Não conheço, quer dizer, nunca vi o senhor António Loureiro mas deixo-lhe aqui um abraço e votos de muitos anos de vida, assim como á esposa e a toda a malta nascida por volta dos anos 20. Não estiveram em La Liz mas o Estado Novo nasceu praticamente com eles. E alguns estão para durar. Aguentaram-se, tiveram uma boa relação de amizade e respeito com a vida. Compreenderam-na e amaram-na. Como disse Frost, “um diplomata é aquele que se lembra sempre do aniversário de uma mulher, mas nunca da sua idade “
É assim meu caro António ?
Eu acho.

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro JBS
Meu velho amigo.

Gostei do teu texto, porque de certo modo se prende com a minha actual experiencia de aprendiz aspirante a velho, mas velho bem disposto se possivel.
Acontece que neste preciso momento, estou num Pais onde devido aos meus cabelos brancos, me tratam respeitosa e
carinhosamente por papa, por vieux ou ainda por excellence.
Um Pais onde os velhos e as criancas sao o centro de todas as procupacoes e cuidados, mesmo nas comunidades mais carenciadas.
Gde abraco
J.Elias Moreno

Anónimo disse...

MEU CARO MORENO

meu velho, me amigo

Se tu quisesses
Ou te dispusesses

A olhar
uma lagoa
ou o mar

Concluirias
Todos os dias

Que ainda eras melhor pessoa

Porque o que trazes
dentro de ti
E o que fazes
aqui

é dar... dar... dar

para quem se quiser abrigar

no porão da saudade
no porão da amizade

meu querido Marques

como tu falavas verdade.

Ab.
JBS

Victor Venâncio Jesus disse...

João trata de te aguentares que ainda falta bastante para chegares á meta... Ou não!?... Isto agora o tempo, passa a correr, para chegar aos noventa é um instantinho, por isso vê lá se vais fazendo uns treinositos, e se nos continuas a entreter até lá... aos 90... Um abraço