sexta-feira, 19 de julho de 2013

CANTINHO DOS MARAFADOS



ALMAS DO OUTRO MUNDO
Autor – Rogério Coelho
Costeleta dos anos 40

O moço(1) frequentava o primeiro ano na Escola Industrial e Comercial Tomás Cabreira em faro.
Naquele dia, e naquela ultima aula da cadeira de língua francesa, a professora faltou; era muito raro a professora D. Irene da Conceição Jacinto faltar.
Uma hora de liberdade era suficiente para uma boa partida de futebol no "estádio" de terra batida do Largo da Sé. Era a última aula da tarde.
Foi já perto do abrir da noite quando a partida de futebol terminou.
Entretanto. o vizinho e colega de turma, Manuel Estevens dos Santos dirigiu-se para casa e a mãe do moço ficou a saber que o filho tinha ido jogar com a "trapeira"(2)  para o Largo da Sé.
Sem conhecimento da malandrice do Estevens, e assim que terminou o jogo, o moço dirigiu-se para casa.
Ao entrar reparou no olhar estranho com que a mãe o fitava.
- Donde é que tu vens? Perguntou a mãe.
- Então, venho da aula, respondeu.
- A tua professora não faltou?
Marosca, pensou, como é que ela sabe? Só pode ter sido o pirata do Estevens(3) que não é capaz de estar calado, o sacana.
- Sim, vim passeando e vendo as montras.
- Eu dou-te as montras, olha para os teus sapatos esfolados, eu dou-te a bola, dou-te é com o chinelo.
E agarrando-lhe a orelha com uma mão e o chinelo na outra começou a sovar-lhe o traseiro enquanto o moço berrava com as dores das chineladas. Conseguiu com esforço libertar-se e fugir, perseguido pela mãe, para o quarto e meter-se debaixo da cama.
- Sai daí, dizia-lhe a mãe.
- Não saio, a mãe bate-me.
- Já te bati, não te bato mais, sai!
E o moço, receoso e com a lágrima no olho, lá se arrastou saindo debaixo da cama.
- Vai lavar as mãos, vou dar-te o jantar e vais para a cama de castigo.
Já a noite ia alta quando, de repente, acordou de um pesadelo que o fez sentar na cama com o coração a bater apressado. E mais apressado bateu ao abrir os olhos e reparando, na penumbra do quarto apenas com uma ténue iluminação que a lua cheia projectava através da clarabóia do corredor, com uma arrepiante e esbranquiçada aparição que, suspensa no enquadramento da porta aberta, lentamente balanceava em silêncio espectral.
            O medo apoderou-se do moço com o pensamento de estar perante uma aparição "fantasma". Quis gritar mas as cordas vocais não respondiam. Tapou-se com o lençol deixando apenas visível os olhos que fixavam aquela aparição. Pouco a pouco, sem deixar de fixar aquele vulto em suspensão, o medo foi-se transformando em coragem.
Lentamente deslizou o braço para fora do lençol na direcção da mesa-de-cabeceira onde sabia estar uma tesoura. Às apalpadelas encontrou e agarrou o objecto com firmeza e, acto contínuo, escorregou sorrateiramente para fora da cama encaminhando-se com os olhos fitos na direcção do vulto. Já perto levantou o braço para desferir o golpe.
Nesse preciso momento uma nuvem que descobriu a lua fez aumentar a visibilidade do luar que penetrava pela clarabóia. Perplexo, o moço evita o golpe ao reparar que aquela aparição era afinal um vestido que a irmã tinha passado a ferro e, para não se amarrotar, o pendurara pelo cabide por cima da ombreira da porta e que, uma pequena aragem o fazia voltear e resplandecia em contraste com a luminosidade do luar que o iluminava por detrás.
Almas do outro mundo que povoam o pensamento e causam medo a certas pessoas, também o fizeram com o nosso moço.
FANTASMAS!

Nota: - Uma pequena história na sua essência verídica.


               (1)Na pessoa do autor;
                   (2)Bola feita com uma meia de senhora que se enchia com trapos de maneira a ficar cheia com o tamanho desejado;
                     (3)Que descanse em paz.


1 comentário:

Associação Antigos Alunos Escola Tomás Cabreira disse...


OLÁ ROGER!
UMA BOA RECORDAÇÃO.
Esperamos mais...

Da Redação