domingo, 26 de abril de 2020



      TALVEZ

        Pior que a convicção do não é a incerteza do talvez. É o talvez que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter vindo e não veio. Quem talvez pudesse ganhar ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem talvez tivesse morrido está vivo, quem talvez amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas ideias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

        Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até talvez pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, talvez sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza. O talvez nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.

        Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos, talvez, somente paciência, porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar talvez, a oportunidade de merecer. Pros erros há perdão; pros fracassos, chance; pros amores impossíveis, tempo. De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor talvez não seja romance. Não deixemos que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar. Desconfiemos do destino e acreditemos em nós. Talvez gastando mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo ou, talvez, quem quase vive já morreu…


           Talvez seja o “vírus”, que nos isola, nos apoquenta com tudo isto…

            Talvez…?

Um arranjo do Roger

Sem comentários: