quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

OUTROS POETAS

Adoro-te PAI...

Pai

Pedaço de um todo…
Amor incondicional…
Indivisível e sobrenatural…

Olhe Pai!
Olhe em sua volta…
Sinta no ar a felicidade bailar…
E em todos os seus sentidos
Sinta a força do meu amor.

Ouça Pai!
Ouça o som desta música…
Hoje sou eu que vou falar…
Você já viveu a se doar,
Tente apenas entender a minha voz.

Perdoe-me Pai!
Faltam-me as palavras…
Este nó em minha garganta
Prende a minha respiração…
E as lágrimas afloram
Junto com a emoção,
De tê-lo como “Meu Pai”.

Eu não te escolhi para ser meu Pai…
Mas tu me escolheste para ser teu filho.

Pai!
Peço ao Pai nosso que estás no Céu…
Que te proteja aqui na terra,
Para que permaneça entre nós
Compartilhando desse AMOR
que aprendi contigo!


IN Silvia Trevisani
Colocado por Rogério Coelho (por ter achado bonito)




OUTROS AUTORES

Nas asas da paixão

Norberto Cunha

"Veja lá ... roubaram os passarinhos do senhor Rodrigues ... "
A notícia correu célere pela aldeia, causando surpresa e indignação.
Familiares, amigos, vizinhos, todos se sentiram roubados e durante dias o sucedido permaneceu assunto de conversa, como se tivesse a dimensão de acontecimento público importante. Daqueles que cativam lugar em qualquer memória. Mas nem outra coisa seria de esperar.
Costumes, sentimentos e afectos moldados pelo viver campesino ainda ali permaneciam vivos, apesar de a implantação da indústria vir esbatendo os mais visíveis traços da ruralidade. E para encanto dos mais pequenos e consolo dos mais idosos, era na quintinha do Sr. Rodrigues que podiam ver-se; ou mesmo tocar-se, patos, pombos, gansos, coelhos, ovelhas, cabras, cágados, até rãs e um multicolor conjunto de pássaros exóticos e nativos. E era destes - a seguir às crianças, a sua maior paixão - que o proprietário mais se orgulhava. Papagaios, araras, colibris, pintassilgos; canários, rouxinóis e muitas outras aves cuja espécie só ele sabia identificar, pululavam em gaiolas móveis e fixas, individuais ou colectivas, enchendo a garagem, anichando-se sob a varanda ou noutros recantos abrigados da intempérie e da insolação.
Algumas das aves até tinham nome. E a par das suas necessidades específicas, a individualidade de quase todas era bem conhecida do Sr. Rodrigues que, gracejando, asseverava haver uma ou outra com tendências e preferências próprias de humanos, embora só uma velha arara parecesse justificar a asserção. Quem dela se aproximava logo era interpelado com a entaramelada saudação de "Á-pu!; Á-pu!; Á-pu!" No entanto, nem a alegada preferência do psitacídeo espelhava a do seu dono, nem, ao invés, constituía motivo de constrangimento para ele. As questões e eventos da política sempre os via à luz dum tolerante e bem-humorado distanciamento, atitude que reforçava a afeição com que o distinguiam vizinhos e conhecidos.
Não fora assim e logo alguém teria atribuído o roubo dos pássaros a uma torpe retaliação de cariz partidário. Mas na pacífica aldeia onde não se perdera ainda o hábito imemorial de só à noite fechar a porta de casa, quem se atreveria a preservá-lo? Ou a responder: "Ora, aqui em Ventais nunca acontece nada", a quem advertisse para o perigo? Quem poderia não se sentir inseguro, traído e revoltado se, de um dia para o outro, aquele fervilhar de passarada que a todos quase pertencia, se sumiu, emudeceu?
Para surpresa de muitos, apesar de tão doída perda foi o Sr. Rodrigues quem menos se alarmou e emotivamente reagiu. Quem sabe, alimentava a secreta esperança de que o ladrão se arrependeria e mais cedo ou mais -tarde, à socapa, lhe restituiria as suas estimadas aves.
A verdade é que, mais pesaroso que indignado, sempre que o inquiriam se limitava a relatar como se apercebera do roubo: Um silêncio sinistro, um vazio opressivo assaltara-o a meio da noite, despertando-o. Preocupado, desceu ao piso térreo e ainda mal abria a porta da entrada já se dava conta do sucedido - as gaiolas abrigadas sob a varanda tinham-se esfumado. Receando o pior, rodeou a habitação e por toda a parte a tragédia repetia-se, inclusive na garagem. Aí apenas restava a velha arara que o larápio, talvez no receio de vir a ser descoberto, não se atreveu a levar.
"Vá atrás do ladrão, queixe-se à guarda" - sugeriam-lhe. "Com certeza é pessoa que conhece bem os cantos à casa".
Outros, mais cépticos, minimizavam a importância do caso e tentavam conformá-lo, ficando-se por um: "Lá terá de arranjar novos passarinhos".
Sem dúvida, o lesado poderia, se quisesse, repor de um momento para o outro o seu aviário. O dispêndio, para alguns proibitivo, não lhe beliscaria os haveres. Contudo, a sua paixão, e paixão retribuída, era por aqueles "passarinhos" que, premiando uma longa convivência, dir-se-ia que o conheciam tão bem quanto ele os conhecia. Ainda assim, ao que pareceu, algum tempo depois o Sr. Rodrigues conformou-se com a perda. Era a tristeza que se dissimulava no coração e, aí recolhida, só de onde em onde e por um momento fugaz lhe fluía no olhar.
§
Estiolaram os fios d'água no remanso. dos ribeiros, recolheram-se os ventos e as festas de Agosto, regressam as crianças à alegre expectativa das primeiras aulas e toda a aldeia terá esquecido já o pequeno drama do furto das aves. Mas, inesperadamente, o Sr. Rodrigues volta a ser alvo de todas as atenções. Desta vez, porém, a notícia arrasta-se pesada e lenta, tolhida por um véu de compaixão, pudor e estranheza.
"O senhor Rodrigues está doente, muito doente", comenta-se em tom grave de respeito e receio evitando a referência ao mal que o aflige. "Coitado, logo tinha de acontecer-lhe uma coisa dessas. É tão boa pessoa". Era mesmo. Nos tempos em que a posse de automóvel sugeria riqueza, havia sido o pronto-socorro da vizinhança e desde sempre a ele meio mundo recorria se precisava de uma ferramenta agrícola ou outra, um cabo eléctrico, um andaime ... O senhor Rodrigues tinha tudo e nunca se fazia rogado.
Agora, sepultada a esperança de reaver o objecto maior do seu orgulho e afeição, perdida a saúde e ameaçada a vida, que mudava nele? Nada, na sua generosa disponibilidade, pouco, quase nada, no trato com toda a gente, mesmo com quem mais de perto convivia. Mas no seu íntimo fustigava-o a dor dum irremediável e definitivo desapossamento, como se de tudo o que possuía nada lhe restasse já. Só o carinho acrescido de familiares e amigos a mitigava. E de novo ninguém lhe escutava o menor lamento, lhe via gesto ou expressão a denotar a tristeza que transparecia tão-só num sentimento de saudade, sempre a invadi-lo a propósito das mais pequenas coisas. Por vezes, escapava-lhe numa silenciosa e tímida lágrima, na presença de quem o visitava pela tardinha, quando se sentava agasalhado, frente à janela, seguindo o sol na sua diária despedida.
Também a velha arara passou a fazer-lhe companhia todos os dias, durante algumas horas. Deixara de palrar por esta altura, mas a sua presença era para o doente um precioso sinal da permanência do mundo de afectos, num mundo a esbater-se inexoravelmente, a abandoná-lo um pouco à passagem de cada dia, cada hora, cada momento.
Breve foi esse tempo. Cada vez mais débil, o Sr. Rodrigues deixou de levantar-se e já só ajudado se movia no leito. E os contornos coisas próximos, domésticas e familiares, confundiam-se-lhe a amálgama de imprecisas cores e volumes, envoltas numa luminosidade variável e indecisa; imersas na quase imperceptível transição do dia à noite e da noite ao dia, marcada por último apenas pela alternância do silêncio com o sussurro de vozes, única e derradeira baliza e medida do escoar do tempo.
Foi então, sem que mais alguém de tal se apercebesse, que na brumosa espessura do silêncio de súbito surgiu uma límpida manhã.
E a memória dos sentidos dormente e dispersa, aflorou ávida e nítida nesse inesperado alvorecer em que, numa festiva e suave alegria, todos os passarinhos do Sr. Rodrigues irromperam pelo seu quarto.
Com ternura, os viu adejar primeiro em seu redor, para descerem depois sobre o seu leito, ou com delicadeza lhe pousarem nos ombros e nos braços, cantando e batendo asas. E sorriu.
E sorrindo, tranquilo, sentiu-se por eles transportado e logo transmutado em pássaro ágil, leve e livre, voando alegre, sereno e sem destino, na claridade dum espaço imenso e luminoso, dum azul sempre azul, um infinito azul.

IN Norberto Cunha – O Triangulo de Dezembro e outras ficções
2007
Colocado por Rogério Coelho (Com autorização do autor)