PROMESSA
Um arranjo de Alfredo Mingau
Para esta história, que não é ficção porque tudo o que aqui escrevo é verídico, apelidámos o principal executante com o nome fictício de “Alfredo”, sendo mera coincidência a semelhança na vida real com qualquer Alfredo. O executante não me autorizou a publicação do seu verdadeiro nome.
Costeleta dos anos quarenta, o “Alfredo” não se podia considerar um bom aluno da Escola Tomás Cabreira da Rua do Município.
A trapeira ou a bola de “catchu”, daquelas que saíam nas rifas dos rebuçados, o peão, o belindre e outras brincadeiras para a idade, não lhe davam tempo para estudar. Não se considerava "burro". Tinha “preguiça” em estudar os manuais ou os apontamentos feitos nas aulas. As notas dos períodos oscilavam entre o 9 e o 10. O “calcanhar de Aquiles” do “Alfredo” era a disciplina de Matemática. Teve 10 no 1º período e desceu para 8 no 2º.
Naúltima aula do 3º período, a terminar o ano lectivo, o professor da disciplina de Matemática, não identificado, chamou vários alunos pelos nomes, disse-lhes que eram os melhores e que tinham toda a possibilidade de dispensarem à prova oral. Era necessário um 14 na escrita. Mandou-os sair e desejou-lhes felicidades. Em seguida chamou um segundo grupo, dizendo-lhes que iriam a exame, que estudassem e mandou-os sair.
Apenas restava na sala um único aluno. O "Alfredo".
-Tenho muita pena senhor "Alfredo", a nota que tenho para lhe dar é um 6.
O“Alfredo”, muito sério, olhou de frente para o professor e falou:
- Gostava de ir a exame “Sô Tor”!
O professor deu um sorriso e respondeu:
- Com o que o senhor sabe de matemática nem um 6 apanhava.
“Alfredo" põe-se de pé e com voz firme disse:
-“Sô Tor”, se me levar a exame eu faço aqui a promessa de dispensar à prova oral.
O professor ouviu, ficou sério, deu a volta à secretária, sentou-se, fixou o “Alfredo”, abanou a cabeça, recostou-se na cadeira com ar pensativo, sem deixar de olhar para o “Alfredo”
- Eu dispenso à prova oral, repetiu o “Alfredo”.
- Você deixa-me desconcertado com a convicção da sua afirmação. Vou-lhe fazer a vontade. Vai a exame disse o professor.
- Obrigado “Sô Tor” exclamou o “Alfredo” e saiu da sala.
Descendo a rua do Município o “Alfredo” sentia-se nervoso, puxou de um cigarro definitivo e fumou para acalmar. “Como é que eu me vou safar desta?” pensou.
Os dias seguintes foram um calvário para o “Alfredo” agarrado ao livro de matemática e aos cadernos de exercícios práticos.
A mãe andava admirada com o estudo do "Alfredo" e obrigava o filho a ir para a cama às duas e três da madrugada para descansar e dormir.
Mas as coisas não corriam bem, aquelas fórmulas da geometria não se encaixavam no cérebro. “Merda!” bradava o “Alfredo”, "Já falta pouco tempo para o exame e o resultado está complicado".
Foi falar com o amigo Nunes que andava na Indústria e era um bom aluno a matemática. E contou-lhe o que se passava, dizendo que não tinha posses para pagar a um explicador e pedia-lhe para lhe dar explicações de matemática. O Nunes riu-se e concordou em dar-lhe uma ajuda. E os restantes dias até ao exame o “Alfredo” recebeu a ajuda do seu amigo Nunes.
Mas as fórmulas da geometria não queriam nada com o “Alfredo”. E no dia "D" fez uma pequena cábula com as fórmulas, enrolou e meteu debaixo do anel. E foi para o exame. A sala era aquela sala grande, na Indústria, à entrada do largo da Sé junto ao Seminário. Para descontrair e acalmar os nervos o Alfredo fumou o cigarrinho definitivos para acalmar. E entrou quando foi chamado. O professor colocou o enunciado sobre as carteiras e deu ordem para começarem o exame. Alfredo leu o enunciado e sentiu uma grande alegria ao verificar que todo o conteúdo do enunciado estava dentro dos seus conhecimentos. Agarrou na cábula, enrolou numa bola e, em jeito de carolo, lançou-a para cima de um armário que se encontrava do seu lado esquerdo. Não precisava dela, a memória trabalhou. E entregou o ponto de exame antes do tempo terminar, sobo olhar admirado do professor.
Eno dia em que a pauta com as classificações foi colocada na vitrina, lá estavao “Alfredo” com a curiosidade e o nervosismo. E leu:
Àfrente do seu nome a classificação de 14 valores, seguido de “dispensado àprova oral”. E reparou que os colegas que o professor esperava dispensassem, iam todos à oral.
-Parabéns senhor “Alfredo”
Voltou-se, na sua frente o professor estendia a mão e repetia “parabéns senhor “Alfredo” o senhor cumpriu”.
-As promessas são para cumprir "Sô Tor", obrigado.
Termino esta história dizendo que ao Costeleta "Alfredo" lhe foi passado o respectivo Diploma de Final de Curso, no ano da graça de 1946.
Meu caro Alfredo!
ResponderEliminarRefiro-me ao Mingau.
Quanto ao "Alfredo" da promessa, eu já conhecia a história. Foi real. Mas eu sei que este "Alfredo" tem mais histórias...
Espero que os "sinónimos", antónimos" "pseudónimos" "anónimos" não brinquem mais com o "alecrim e a mangerona". Reparem que este anónimo Alfredo da história, é mais Costeleta que todos os que por aqui andam. Não dizem que a antiguidade é um posto?. Qual é o comentarista deste blog que é mais antgigo?. Um diploma de 1946 corresponde a um Costeleta de 1942. 3 anos de curso.
Um abraço. Venha mais destas histórias. São dos nossos!
Rogério Coelho
Gostei de ler e reler esta história.
ResponderEliminarOs Costeletas daquele tempo eram assim, firmes!
Querer é poder.
Costeleta assídua