MEUS CAROS AMIGOS COSTELETAS,
Nos velhos papéis, encontrei este quando da apresentação do meu primeiro livro e achei que não só as mulheres da Planície são dignas da minha Florbela, pelo que resolvi também mostrá-lo em louvor das Costeletas. Aí vai.
DISCURSO APRESENTAÇÃO DE
“PUTOS GANDULOS E GUERRA”
22/04/2000
Porque a vida não se troca, nem se vende por nada!
Só não sente, quem não tem capacidade para recordar!
A influente conspiração contínua, do adquirido sobre o inato. Vai metamorfoseando o (barro) Homem, inoculando-lhe na inocência, -“o saber de experiência feito”- a escola da vida. Assim se vai nesta complementaridade, construindo o Ego de cada um de nós.
Escrito sobre homens. Subreptíciamente vai revelando a influência da mulher, na sua desmultiplicação de: Mulher mãe, irmã, amante, companheira e amiga. Heis pois, como gato sobre brasas, “Putos, Gandulos e Guerra” transcreve: a observação -vivida- de alguém sobre o que o rodeia.
Não é este livro, pretensão literária! Mas tão somente o tentar transpor para a escrita, o sentir da vida -sofrida- do povo da Planície.
E porque não também, essa força-mulher, que foi Florbela Espanca?
Pobre de Cristo
Ó minha terra na planície rasa,
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viste o mar,
Onde tenho o meu pão e a minha casa.
Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folhas... a dormitar...
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra moirisca a arder em brasa!
Minha terra onde meu irmão nasceu
Aonde a mãe que eu tive e que morreu
Foi moça e loira, amou e foi amada!
Truz... Truz... Truz... _Eu não tenho onde me acoite,
Sou um pobre de longe, é quase noite,
Terra, quero dormir, dá-me pousada!...
Sou um sofredor!... O cordão umbilical ainda não me foi cortado. Confio que não o seja!... Sinto-me bem ligado à Terra-Mãe.
Por esse motivo, aqui trago estas folhas, as quais espero sejam o símbolo de uma aldeia una, nesta linda planície.
Assim sendo:
Este livro não é meu!
É dos que do nascer ao pôr do sol, -por magra jorna- trabalharam a terra que não era sua.
É de quem vergado sob o sol escaldante de meio do dia esgotava as forças -dádiva da magra açorda com azeitonas-, puxando pela torta, ceifando o -pão- trigo do mítico celeiro de Portugal.
Este livro é também dos e das que encharcados, sob o agreste frio e chuva do Inverno enterrando as mãos na gélida terra, apanhavam: a fonte que daria força às sopas e luz à humilde candeia.
Este livro é das mulheres escravas que após um dia de trabalho, em vez do merecido descanso, tinham ainda marido e filhos para tratar e a casa que, limpa e branquinha, lhes dava merecido orgulho!
Este livro é daqueles e daquelas que sofreram a saudade da partida e a ansiedade da chegada, dos seus mais queridos, que viram partir para a guerra!
Este livro é dos que aqui nasceram, e dos que aqui chegando criaram raízes!
Também vale a pena recordar Eugénio de Andrade:
Eu sou devedor à terra,
E a terra me está devendo.
Que a terra me pague em vida,
Que eu pago à terra em morrendo.
Este livro é vosso homens e mulheres da minha terra!
Manel Piorna, amigo do blogue, convidado e costeleta de ELVAS.