sexta-feira, 5 de agosto de 2011


ERA... NAQUELE TEMPO

Alfredo Mingau


"... Era um tempo em que tudo se fazia tremendamente simples.
Os sorrisos rasgados eram consequências de situações de amizade.
Liberdade era sinónimo de poder brincar e ficar sujo, sem tempo contado.
As maiores frustrações decorriam de mau desempenho de fazer.
As grandes dores eram causadas por ferimentos no corpo.
A tristeza era sempre passageira, não ousava vir para ficar.
Os melhores amigos eram companheiros de todas as horas.
Os pais, super-heróis.
Houve um tempo em que tudo era tremendamente simples.
Sábado à noite, no Verão, era apenas a oportunidade de brincar com os amigos no Jardim Manuel Bívar.
Sucesso era passar de ano sem chumbar para repetir
Os desentendimentos eram resolvidos pela dinâmica porrada, pedido de desculpas dos pais, e puchão de orelhas.
Alegria acima de todas as expectativas era o primeiro dia de férias de verão.
Competitividade era somente o que tornava aqueles jogos de “hóquei” na nossa rua, em que as balizas eram as sargetas
Amor era um sentimento puro, que não causava dor, geralmente platónico
A noite de natal era mágica, com a alegria de manhã, ao encontrar na chaminé um par de peúgas e uma tablete de chocolate; o Pai Natal era um grande camarada. Os ovos de Páscoa causavam euforia.
Programa de férias era assistir ao Sábado no cinema Santo António, à matinée, aos filmes do Abot e Costelo.
Naquele tempo tudo era tremendamente simples.
E tem dias que o fantasma doce dessa simplicidade lança olhares espantados, como que perguntando “quando foi que a vida ficou tão complicada...?"


E agora “moces”, malta jovem, “neste tempo” para complicar as férias as aulas começam ou recomeçam já no dia 8 de Setembro.


Guerra Junqueiro - Muito Actual !

"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio,
fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora,
aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias,
sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice,
pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas;
um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai;
um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom,
e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que
um lampejo misterioso da alma nacional,
reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula,
não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha,
sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima,
descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas,
capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação,
da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo;
este criado de quarto do moderador; e este, finalmente,
tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política,
torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções,
incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos,
iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero,
e não se malgando e fundindo, apesar disso,
pela razão que alguém deu no parlamento,
de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."

Guerra Junqueiro, 1896.

Enviado pelo Maurício

Produto Nacional
Figos e Amêndoas do Algarve

O artigo sob o título acima do Colega Palmeiro publicado em 2011.07.12, fez-me lembrar duas viagens que em tempos fiz à zona de Granada/Gibralter, para visitar um agricultor conhecido. Posteriormente, o Jornal de Monchique também viu figos da Turquia vendidos como lembrança do Algarve. – Não lhes chamava “secos”. Chamava-lhes “pecos”, cujo termo nós conhecemos.
Isto daria para rir, não fosse o estado calamitoso a que fizeram chegar a nossa agricultura.
Para não estar só à janela como muito bem disse o nosso amigo JEM, saí à rua...

---oooOooo---

Por volta de 1968, na descida abrupta de Granada para Motril vi um agricultor apanhar amêndoas em zona tão acidentada que se segurava a uma corda, (algo que aqui também já vira com a apanha de alfarroba, o que, em termos de rendimento não podia contar para as estatísticas).
Mais tarde, cerca de vinte anos após, numa zona próxima, ao pretender visitar um agricultor granadino, encontrando-me numa encruzilhada junto a uma plantação de oliveiras encontrei outro agricultor, com o seu Jeep, perguntei-lhe onde iria dar aquele caminho rural, ao que ele me respondeu ... “solo Dios sabe”...
Eu pretendia encontrar a herdade e chegar de surpresa e perguntava pelo tal agricultor mas sem referir o seu nome, o que não resultou.
Kms. mais à frente, parei e perguntei pelo agricultor de destino mas referindo o seu nome, disseram-me de imediato – é o Eng. da Azucarera - (fábrica de açúcar de cana em Motril) – pelo que vi que estava no caminho certo.
Encontrado o agricultor e, depois dos cumprimentos iniciais, foi-nos servido um repasto de “habas”, seu prato típico. Passamos pela herdade. Para seu recreio tinha um pouco de quase tudo, - cavalos, ovelhas, coelhos. Com a charrete e cavalos já ganhara prémios em Málaga. O terreno, constituído por socalcos devido ao acidentado do relevo era composto quase exclusivamente por oliveiras e amendoeiras. Via-se, lá nos píncaros, a uns vinte quilómetros, esbranquiçar, a neve da Serra com o seu nome. Por ser época de azeitona estavam as árvores carregadas e a apanha, marcada para breve, era feita em grupos e com rapidez.
Quanto às amendoeiras, já o fruto tinha sido apanhado na época própria e, ao contrario das nossas não tinham uma amêndoa por recolher. Intrigado, perguntei-lhe como apanhava tanta amêndoa, ao que ele me respondeu: – “com um maço de goma”.
Apercebi-me então que apanham a amêndoa em equipa de pessoas que seguram no panal enquanto uma delas bate com o maço de borracha no tronco da árvore, previamente podada para suportar o embate, não caindo a amêndoa ao chão. São acompanhados a poucos metros pelo mini-tractor, devido ao relevo do terreno, com a caixa acoplada. A caixa do tractor é alta. Como as nossas. Uma vez cheia de amêndoa, vai para a organização agrícola. Ao ser pesada é-lhe retirada por cada abertura da caixa, onde cabe uma mão, cerca de 1 kg. de amêndoa, para conhecer a densidade, humidade, verde, etc. Após isso sabe quanto irá receber. Amêndoa em sacas? – Não sabem o que é isso.
No Alentejo, parece que hoje, passados outros vinte anos já se pratica o mesmo processo, mas, parte dessa amêndoa deve ir a salto para outras paragens, já que os donos não são de cá.
Quanto à nossa, varejada com a tal “vara de castanho”, caindo sobre os cardos, resta-nos invocar o Emiliano da Costa.
Júlio Dantas dizia, há muitos anos, no assalto ao convento: “Tanto livro - e ninguém nos ensinou a ler”. Nós poderíamos dizer: Tanta amendoeira e nada nos motivou para a sua apanha.
Um abraço.
Romualdo.