domingo, 26 de fevereiro de 2017

CANTINHO DOS MARAFADOS


UM SERVIÇO ATRIBULADO


Jorge Gancho estudara na Tomas Cabreira. Acabou o curso e passou a dirigir administrativamente os negócios do padrinho que, ali no Rio Seco, dedicava-se à criação de porcos. Naquele dia o Jorge chamou os empregados Diogo e Narciso para carregarem os leitões da pocilga número cinco na pequena camioneta e fazerem a entrega ao cliente de Paderne. A manhã estivera chuvosa, mas, depois do almoço, o tempo levantara e o dia estava solarengo.  
Pouco depois de terem partido e cerca de Almancil avistaram na estrada, pedindo boleia, um padre segurando um cabrito. O Diogo, condutor da viatura, e que não pode ver um servo de Deus em dificuldade, parou prontamente o camião para ver se poderia ajudar aquele santo homem. O padre caminhou até à janela e explicou que precisava levar o Calisto, que era o nome do bode, ao assador de leitões de Paderne. Que o motorista do autocarro não permitira que o Calisto subisse a bordo, nem pagando a respectiva passagem. Que achava um despropósito porque o animal era sossegado não conseguindo convencê-lo por ser teimoso. O Diogo respondeu dizendo que não se mortificasse porque era precisamente ao assador de Paderne que iam entregar os leitões e podiam levar o Calisto. O padre desfez-se em agradecimentos. Em seguida despediu-se e aproveitou para tomar o autocarro que nesse momento passava. Da porta da viatura, porque reparara que levavam um garrafão no camião, recomendou:
- Ah! Não dêem bebida alcoólica ao Calisto que ele fica muito excitado.
E as complicações começaram.
Quando o Narciso abriu a parte de trás da viatura para meter o Calisto, os leitões assustaram-se com o novo companheiro de viagem e puseram-se a correr em debandada para fora da viatura espalhando-se pelo mato.
Pegar leitão no mato não deve ser das coisas mais invejáveis e correr atrás de leitão sujo de lama é difícil porque ficam escorregadios. O Diogo e o Narciso perderam mais de uma hora para recolher toda a porcalhada. O novo proprietário não iria ficar nada satisfeito com a mercadoria em estado deplorável. O Narciso alertou o facto e o Diogo respondeu que o fundamental era entregar os doze animais ao comprador sãs e salvos.
Aquela correria encheu-os de sede. O Narciso pegou no garrafão da aguardente de figo que sempre os acompanhava. O Diogo bebeu meia caneca porque era o condutor e foi para o volante. O narciso bebeu uma caneca e, olhando para o Calisto nota que o observa com olhar de carneiro mal morto e pergunta:
- Também queres?
E deu-lhe uma caneca porque não ouvira o padre dizer para não darem bebida alcoólica ao Calisto.
O Calisto fica excitado e corre atrás dos suínos para agarrar algum.
Depois de muito trabalho o Narciso conseguiu atar o calisto na grade da viatura.
E voltaram à estrada.
Mais adiante o Diogo vê uma linda moça, toda decotada e com a saia puxada, mostrando o pernão, pedindo boleia na berma. O Diogo, com os olhos em bico, trava o carro junto da moça. Ela veio rebolando as ancas e, junto da janela, pergunta com voz meiga, e um sorriso convidativo, se passariam pela igreja de Boliqueime. O Diogo respondeu que sim e disse ao Narciso para abrir a porta de forma que ela entrasse e se espremesse no meio dos dois.
A moça sorriu satisfeita, dirigiu-se para uma moita na berma e berrou:
- Podes vir avó! Estes otários levam-te!
Acto continuo e detrás da moita aparece uma velha carregando um baú de madeira.
A moça olha para o Diogo e grita:
- Deixa-a à porta da igreja de Boliqueime!
De seguida, dirige-se atrás da moita e aparece sentada numa mota gritando:
- Ah! e não a deixem beber aguardente porque fica excitada!
Acelerou e sumiu-se na estrada.
O Diogo e o Narciso olham-se com admiração e espanto e, sem pronunciarem qualquer comentário, deixam entrar a velha e retomam o caminho com o baú junto dos leitões.
Deixaram a velha no largo da igreja de Boliqeime e retomaram para Paderne.
Quando entregaram a carga no destino tiveram que pedir desculpa ao comprador dizendo que a grade se abrira e os leitões fugiram para o mato com grande dificuldade em os recuperar.

Um arranjo de Roger


PS: - Qualquer semelhança com pessoas da vida real é mera coincidência. Escrito sem o acordo ortográfico. Verdade ou ficção?