quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

À QUINTA ESCREVO EU.

A TERTÚLIA TODOS BEM
Por João Brito Sousa


Era na leitaria do bairro que reuníamos às quintas feiras. Éramos quatro já avançados na idade e também nas ideias, mas conseguíamos conciliar os pontos de vista de cada um. Tínhamos estudado juntos na juventude e agora cada um ocupava o tempo da melhor maneira possível. Todos tínhamos feito carreira profissional razoável e não tínhamos dificuldades de maior. Vivíamos. O Artur Mendes, era o tipo capitalista do grupo e tomava sempre um Old Parr ás quatro da tarde, que era hora que nos juntávamos. Era por isso que o Artur embirrava connosco, porque achava que a Tertúlia se devia chamar a Tertúlia da Hora Amarela.
Tínhamos combinado não falar de política nem de religião, coisa que o Tomás Marques achava disparate, tudo na vida é política dizia ele. Admirava os políticos Africanos, dizia que África era o futuro. E depois falava de Luanda, onde tinha trabalhado, com tal ênfase, que nos deixava encantado. E fazia uns versos para consumo caseiro e era um bom declamador de poesia.
Às vezes, eu ou o Pedro Santos, dávamos-lhe um toque, ó Tomás, isto hoje está a precisar de um pouco de poesia. E logo o Tomás recitava António Jacinto, "Naquela roça grande não tem chuva ", ou o Namoro de Viriato da Cruz,"Num canto sim, noutro canto não", com o charme dum profissional. O Tomás, era um homem com uma habilidade manual fora de série, além dos versos fazia também os seus desenhos.
A leitaria estava bem apetrechada de pessoas, algumas mulheres de meia idade para cima iam ali tomar o café com leite das quatro da tarde, e, essa presença agradava ao Santos, que era um doidivanas e por causa disso, não passou do quinto ano, apesar de tirar uma excelente nota a inglês. Mas safou-se, emigrou para os Estados Unidos da América, onde foi padeiro e conseguiu amealhar uns cobres. Uma vez, o boss disse-lhe:
- Ehi Peter, you have a drink.
- No sir, thank you, my stomach no fill ó good.
E foi ele também que contou aquela história da light, quando ia para o trabalho às seis da manhã com os outros, naquele dia iam já atrasados e o condutor, passou o semáforo vermelho. O polícia fez alto e disse:
- Então, não viste o semáforo vermelho?
- Eu vi o semáforo vi, não te vi foi a ti.
Pedro, que na juventude tinha sido um cábula no Liceu, fora, todavia, um grande jogador de bilhar às três tabelas e, no bilhar pequeno, jogava muito bem ao tacho e limpava a malta toda. Às vezes falava nisso, poucas, porque agora, já com quase setenta anos, andava sempre a trautear o tema "Ó tempo volta para trás". Às tantas eu disse-lhe.
- Preparaste alguma coisa de especial para abordarmos hoje, ó Mr. Peter?
- Mas não eras tu, ó Tomás, que ficaste de preparar qualquer coisa sobre a Revolução Francesa.
- Não tive tempo, ainda ando a digerir os 5/ 0 no Dragão, disse o Tomás.
- Aquilo foi sério, disse o Mendes.
- O Mourinho também levou cinco e diz que não, diz que é fácil digerir uma derrota por cinco a zero, disse o Marques.
- Será ? interrogou-se o Artur.
Olhei para o relógio e eram 19 horas.
- Malta sabem que horas são? Indaguei eu. Vamos mas é embora. Foi pena, não dissemos nada de jeito.
- Nã, eu preparei um trabalho, disse o Pedro.
- Fica para a próxima, disse eu.
- O "dolce fare nienti" também me agrada, disse o Marques.
- E a mim também, disse o Artur.
E despedimo-nos com um até amanhã.
O Artur ainda disse:
- Apesar de tudo foi bonito.
- O quê, indagou o Pedro.
- Mantermos esta grande amizade que nos une, é bonito, disse o Artur.
E abraçámo-nos os quatro como se tivéssemos marcado um golo. E dissemos:

Alabi, Alabá, Bum, Bá, Escola, Escola, Escola.

Todos à chegada a casa, foram bem recebidos pelas respectivas. Tudo bem com a TODOS BEM.
Deixo-vos um abraço costeleta.

jbritosousa@sapo.pt

1 comentário:

Anónimo disse...

frica, para saciar a sua sede de ouro negro.
E os coqueiros continuam balouçando os seus verdes e sucolentos cocos, os imbondeiros a sua perene mas verdejante ramada.
Boa Noite.

J.Elias Moreno