domingo, 7 de novembro de 2010

O VELHO E A GAIVOTA (cont)
Por João Brito Sousa

Dr. vamos sentar-nos na biblioteca, quero falar com o senhor.
- Ok. Vamos. Diga, disse o Guedes já sentado.
- O senhor sabe, disse eu, que eu trago comigo um problema igual ao seu. Apaixonei-me igualmente pelo enigma dum velho, que talvez seja o seu velho. Aconteceu-me a mim o mesmo que ao senhor. Foi no mesmo jardim, pelo menos. Vai lá voltar?
- Sim, hoje. Ele diz que estará lá hoje de tarde, disse o Guedes.
- A que horas?
- Não diz. Se quiser, apareça na sexta feira de tarde, foi o que disse. Venha ver se a gaivota veio, se também está. Tenho um grande problema, disse.
- E não falou em desgostos ? perguntei eu.
- Sim falou, Grandes, que teve grandes desgostos, disse-me o velho
- Bom, o que é que o senhor acha disto? Somos nós ou o velho que estamos doidos ? O mundo está mal e nós estaremos melhor, indaguei eu.
- Não sei. O velho cativou-me e parece ter coisas para me dizer. O problema dele deverá ser aliciante. Ele fala dum modo esquisito, quer dizer, pareceu-me falar num misto de saudade e negligência. Pareceu-me, pelo menos, disse o Guedes.
- Mas isso não é relevante, deve haver aí mais qualquer coisa para que o senhor se entusiasmasse assim tanto com um problema que é doutros. Eu estou a dizer-lhe isto mas também estou nessa, preocupar-me com um problema que não é meu mas que eu quis que fosse meu. Não percebendo como. Penso que isto só tem uma solução que é irmos falar com o velho de novo, disse eu.
- Os dois ? perguntou o Guedes.
- Sim, o Dr. tem o encontro marcado, vai á frente e dirige-se a ele. Eu fico por ali, a andar de um lado para o outro e logo se vê.
- Concordo. Então vemo-nos logo, disse o Guedes
- Até logo.
Quando eu cheguei ao jardim já o Dr. Guedes estava sentado no banco com o velho, que estava virado de costas, olhando, talvez na direcção da gaivota. Fui em direcção ao banco onde estavam sentados os dois cavalheiros e disse boa tarde. O Guedes respondeu mas o velho não. Aliás, passado algum tempo, perguntou.
- Os senhores conhecem-se?
- Sim, disse eu
- Mas porquê os dois aqui, a esta hora, perguntou o velho.
- O senhor disse-me se eu quisesse vir hoje, poderia vir, disse o Dr. Guedes.
- Sim, mas o senhor é uma ou duas pessoas ?
- Somos duas pessoas que temos o mesmo problema, ou seja, temos ambos um problema único, aliás como o senhor, que tem um grande problema, não é verdade, perguntou o Guedes.
- Então e que pretendem, perguntou o velho.
- Conhecer de perto o seu grande problema. Eu e este senhor temos essa curiosidade, porque o senhor falou com tal ênfase desse problema que nos deixou intrigados, disse o Guedes.
- É uma questão interna, pessoal, do meu foro íntimo, está a ver.
- E é grave, pode-se saber? indagou o Guedes.
- Amanhã, a esta hora aqui, se acharem bem. E se a gaivota vier, claro.
- Ela hoje veio? perguntei a propósito.
- Veio claro. Se ela não estivesse eu também não estava.
- Porquê, perguntei.
- Amanhã, disse o velho.
E foi-se embora.
SER JOVEM, SIM

Para o Romão da Náutica.


Meu amigo, um homem nunca envelhece
E mesmo na casa dos setenta não desanima
Há coisas que só ele sabe e nunca esquece
E deve viver a vida com melodia e rima ...

Digo-te isto por te saber um poeta da vida
E assim não tens direito a desistir; resiste
A estrada a percorrer é bastante comprida
Mas dizer não, não, essa palavra não existe

Meu caro poeta, aceita um abraço amigo
Um voto de confiança quero deixar contigo
E a tua vida será a mais bela flor do jardim

A vida não é o presente, mas sim, mais o agora
Dificuldades, muitas, mas o homem não chora
E considerar-se velho não; mas ser jovem sim


João Brito Sousa