quinta-feira, 18 de novembro de 2010

o natal que se aproxima

O ALTAR DO MENINO JESUS
Por: Maria José Fraqueza

Algumas tradições natalícias vão extinguindo nos nossos dias. Embora alguns mais agarrados a elas procurem mantê-las, há muitos costumes que foram desaparecendo. As crianças actuais já não vivem os velhos sonhos da inocência, esses sonhos num mundo de magia por desvendar, os seus sonhos cor de rosa feitos de pequenas ilusões... elas sabem já que os bebés não vêm no "bico da cegonha; e os "pais natais" ou o "Menino Jesus", também não descem às chaminés.
As famílias mais tradicionais, principalmente nas aldeias serranas e algumas do litoral, tinham o hábito de fazer o Altar do Menino Jesus, a que alguns designam por "Presépio Tradicional do Algarve”, costume de arte popular que foi bastante usual no século XIX.
A minha bisavó materna que ia sempre festejar o Natal a casa de sua mãe que vivia numa aldeia distante, com ela havia aprendido a fazer o Altar do Menino Jesus - o Altar das Searinhas - tal como ela dizia.
Mal começava o mês de Dezembro, era chegado o dia oito - Dia de Nossa Senhora da Conceição - e já em casa havia os grãos de trigo para as searinhas.
- Vamos pôr o trigo de molho nos pratinhos, a ver qual a searinha que mais cresce? - dizia entusiasmada a minha avó e continuava:
- Aquela que mais crescer será aquele que receberá mais bênçãos do Céu por ter cumprido os seus deveres, isto é, o Menino Jesus há-de colocar mais presentes no seu sapatinho.
Era grande o entusiasmo para ver as sementes do trigo crescer nos pratinhos. Mas o altar começava desde logo a fazer-se. Lá ia a avó à velha arca buscar as lindas toalhinhas bordadas para os diversos planos de escada do altar. Qual deles o melhor bordado, feito pelas suas mãos hábeis de mulher rendeira. E as lindas rendas de bilro e de crochet na ponta dos "naperons" bordados com lindos motivos. Depois, vestia primorosamente o Menino, com um lindo vestido cheio de rendas, branco como a neve pura e colocava-o lá no cimo do altar, porque ele era o rei dos reis, dava-lhe um destaque especial. Era lindo o menino de bracinhos elevados ao céu, de olhos brilhantes e boquinha de romã - uma relíquia de imagem de família, benzida pelo bispo da região.
- Avó quem fez este lindo vestido para o Menino Jesus? - perguntava ao ver aquela preciosidade rara. Não me dás para o meu boneco?
- Era só o que faltava... este vestido do Menino Jesus foi a minha bisavó que me deu, é como o vestido de baptizado do teu avô, relíquias que servem apenas para ocasiões mais solenes. O vestido do Menino Jesus é só dele.
- É verdade, ele também passou tanto frio, sem ter roupinhas, naquela pobre manjedoura...
- Vês como tu és compreensiva, assim é que os meninos devem ser.
E o altar que fazia lembrar uma pirâmide, onde sobressaía o verde e alvura das toalhas de linho. Tudo ia ficando verdinho com as searinhas que cresciam dentro dos pratinhos. Uma decoração simples, singela, mas de tamanha beleza... e as lindas flores de papel, perfumadas com "água de cheiro da flor de laranjeira", que lhes dava um aspecto colorido... eram cravos e rosas... daí a velha quadra:

Ó Meu Menino Jesus
A sua capela cheira
Cheira a cravos, cheira a rosas
Cheira a flor de laranjeira.
E lá vinham as vizinhas ver sempre o altar da Tia Emília, que era sempre o mais bonito. Todos os charoleiros iam lá cantar, junto daquele lindo altar.
Havia sempre uma porta aberta ao coração, as "filhoses de joelho", quentinhas para dar a todos que batiam à porta, ou uma "Linguiça" com o belo pão caseiro, que ela amassava também com mestria.
O altar naquela casa era imprescindível, aprendera a fazê-lo naquela aldeia serrana, onde vivia a sua mãe. Este velho costume trouxera ela para o litoral algarvio, porque havia casado com um pescador.
Quando recebia algum visitante (nesta altura era hábito também a visita dos familiares), tal como no estrangeiro que na época natalícia se deslocam à sua terra natal, vinha sempre a Tia Antónia com um presente de laranjas, e uns colares feitos com bolotas para as crianças.
- Que colares são estes de "beletas"? - perguntei um dia aos vê-los.
- Isto é para comerem na noite de Natal para não terem dores de dentes!
Depois lá ia ela ver o famoso altar e ficava embevecida. Cantavam a oração de Natal e ensinavam-nos velhas cantigas.
Era assim a adoração ao Menino Jesus feita nos lares. Igualmente pelas ruas os "charoleiros" eram portadores de um pequeno andor (charola) onde levavam o Menino Jesus pejas ruas, cantando ao som de "matracas" ¬eram as Janeiras de porta em porta, que anos depois começaram a surgir as actuais charolas.
BEM QUERER

ASSUNTO: Campanha de solidariedade Bem-Querer
Para os devidos efeitos cumpre-nos informar a realização da campanha de solidariedade social “Bem-querer”, no dia 20 de Novembro de 2010, entre as 9 e as 18h, no Jumbo de Faro no âmbito do protocolo existente entre a Junta de Freguesia da Sé, a Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral Faro e o Centro de Saúde de Faro e teve inicio no dia 15 de Dezembro de 2007.
Tem como objectivo a angariação de roupa e bens materiais (novos e/ou usados):§ banheiras,
§ espreguiçadeiras
§ produtos de higiene
§ cremes hidratantes e para o rabinho
§ fraldas e toalhitas
§ leite em pó
§ papas
§ tesoura, anéis de dentição
§ biberões e chupetas
§ brinquedos para recém-nascido
§ carrinhos com ou sem ovo
para grávidas e bebés (até 5 anos de idade), de modo a satisfazer as necessidades básicas das famílias mais carenciadas da nossa freguesia.

Vimos por este meio solicitar a divulgação deste evento, de forma a que se torne do conhecimento do maior número de pessoas possível, contando assim com a vossa colaboração.

Antecipadamente gratos pela atenção dispensada, apresentamos os nossos melhores cumprimentos.


Conceição Jardim
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Técnicas de Saúde
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Junta de Freguesia da Sé - Faro
Delegação da Penha
Rua Jornal "O Algarve" nº 39 8005-243 Faro
Tel: 289 803 416
Fax: 289 803 417
www.jf-se.pt

OUTROS AUTORES

UMA SIMPLES FLOR
NOS TEUS CABELOS CLAROS


De José Cardoso Pires

«Mas a meio caminho voltou para trás, direita ao mar. Paulo ficou de pé no areal, a vê-la correr: primeiro chapinhando na escuma rasa e depois contra as ondas, às arrancadas, saltando e sacu¬dindo os braços, como se o corpo, toda ela, risse.
Uma vaga mais forte desfez-se ao correr da praia, cobriu na areia os sinais das aves marinhas, arrastou alforrecas abandonadas pela maré. Eram muitas, tantas como Paulo não vira até então, espapaçadas e sem vida ao longo do areal. O vento áspero curtira-lhes os corpos, passara sobre elas, carregado de areia e de salitre, varrendo a costa contra as dunas, sem deixar por ali vestígios de pegada ou restos de alga seca que lhe resistissem.»
«Marcaste o despertador»
«Hã?»
«O despertador, Quim. Para que horas o puseste?»
«...E tudo à volta era névoa, fumo do mar rolando ao lume das águas e depois invadindo mansamente a costa deserta. Havia esse sudário fresco, quase matinal, embora, cravado no céu verde-ácido, despontasse já o brilho frio da primeira estrela do anoitecer...»
«Desculpa, mas não estou descansada. Importas-te de me passar o despertador?»
«O despertador?»
«Sim, o despertador. Com certeza que não queres que eu me levante para o ir buscar. És de força, caramba.»
«Pronto. Estás satisfeita?»
«Obrigada. Agora lê à vontade, que não te torno a incomodar. Eu não dizia? Afinal não lhe tinhas dado corda... Que horas são no teu relógio? Deixa, não faz mal. Eu regulo-o pelo meu.»
«- Mais um mergulho - pedia a rapariga.
A dois passos dele sorria-lhe e puxava-o pelo braço;
- Só mais um, Paulo. Não imaginas como a água está estupenda. Palavra, amor. Estupenda, estupenda, estupenda.
Uma alegria tranquila iluminava-lhe o corpo. A neblina bailava em torno dela, mas era como se a não tocasse. Bem ao contrário: era como se, com a sua frescura velada, apenas despertasse a morna suavidade que se libertava da pele da rapariga.
- Não, agora já começa a arrefecer - disse Paulo. - Vamo-nos vestir?
Estavam de mãos dadas, vizinhos do mar e, na verdade, quase sem o verem. Havia a memória das águas na pele cintilante da jovem ou no eco discreto das ondas através da névoa; ou ainda no rastro de uma vaga mais forte que se prolongava, terra adentro, e vinha morrer aos pés deles num distante fio de espuma. E isso era o mar, todo o oceano. Mar só presença. Traço de água a brilhar por instantes num rasgão do nevoeiro.
Paulo apertou mansamente a mão da companheira;
- Embora?
- Embora - respondeu ela.
E os dois, numa arrancada, correram pelo areal, saltando poças de água, alforrecas mortas e tudo o mais, até tombarem de cansaço.»
«Quim... »
«Outra vez?»
«Desculpa, era só para baixares o candeeiro. Que maçada, estou a ver que tenho de tomar outro comprimido.»
«Lê um bocado, experimenta.»
«Não vale de nada, filho. Tenho a impressão de que estes comprimidos já não fazem efeito. Talvez mudando de droga... É isso, preciso de mudar de droga.»
«- Tão bom, Paulo. Não está tão bom?
- Está óptimo. Está um tempo espantoso.
Maria continuava sentada na areia. Com os braços envolvendo as pernas e apertando as faces contra os joelhos, fitava o nada, a brancura que havia entre ela e o mar, e os olhos iam-se-lhe carregando de brilho.
- Tão bom - repetia.
- Sim, mas temos que ir.
Com o cair da tarde a névoa desmanchava-se pouco a pouco. Ficava unicamente a cobrir o mar, a separá-lo de terra como uma muralha apagada, e, de surpresa, as dunas e o pinhal da costa surgiam numa claridade humilde e entristecida. Já de pé, Paulo avistava ao longe a janela iluminada do restaurante.
- O homem deve estar à nossa espera - disse ele. - Ainda não tens apetite?
- E tu, tens?
- Uma fome de tubarão.
- Então também eu tenho, Paulo.
- Ora essa?
- Tenho, pois. Hoje sinto tudo o que tu sentes. Palavra.
«Se isto tem algum jeito. Qualquer dia já não há comprimidos que me cheguem, meu Deus.»
«Faço ideia, com essa mania de emagrecer... »
«Não, filho. O emagrecer não é para aqui chamado. Se não consigo dormir, é por outras razões. Olha, talvez seja por andar para aqui sozinha a moer arrelias, sem ter com quem desabafar. Isso, agora viras-me as costas. Nem calculas a inveja que me fazes.»
«Pois.»
«Mas sim, fazes-me uma inveja danada. Contigo não há complicações que te toquem. Voltas as costas e ficas positivamente nas calmas. Invejo-te, Quim. Não calculas como eu te invejo. Não acreditas?»
«Acredito, que remédio tenho eu?»
«Que remédio tenho eu... É espantoso. No fim de contas ainda ficas por mártir. E eu? Qual é o meu remédio, já pensaste? Envelhecer estupidamente. Aí tens o meu remédio.»
«Partiram às gargalhadas. À medida que se afastavam do mar, a areia, sempre mais seca e solta, retardava-lhes o passo e, é curioso, sentiam as noite abater-se sobre eles. Sentiam-na vir, muito rápida, e entretanto distinguiam cada vez melhor, as piteiras encravadas nas dunas, a princípio pequenas como galhos secos e logo depois maiores do que lhes tinham parecido à chegada. E ainda as manchas esfarrapadas dos chorões rastejando pelas ribas arenosas, o restaurante ermo, as traves; de madeira roídas pela maresia e, cá fora, as cadeiras de verga, que o vento tombara, soterradas na areia.
- O mar nunca aqui chega - tinha dito o dono da casa. - Quando é das águas vivas, berra lá fora como um danado. Mas aqui, não senhor. Aqui não tem ele licença de chegar.»
«A verdade é que são quase duas horas e amanhã não sei como vai ser para me levantar. Escuta...»
«Que é?»
«Não estás a ouvir passos?»
«Passos?»
«Sim. Parecia mesmo gente lá dentro, na sala. Se soubesses os sustos que apanho quando estou com insónias. A Nanda lá nisso é que tem razão. Noite em que não adormeça veste-se e vai dar uma volta com o marido, a qualquer lado. Acho um exagero, eu nunca seria capaz de te acordar... mas, enfim, ela lá sabe. O que é certo é que se entendem à maravilha um com o outro. E isso, Quim, apesar de ser a tal tipa, que tu dizes. Também, ainda estou para ter uma amiga que na tua boca não seja uma tipa ou uma galinha.»



IN José Cardoso Pires,
1999

Colocado por Rogério Coelho.