quarta-feira, 17 de setembro de 2008

PARA DISCUSSÃO FILOSÓFICA ENTRE COSTELETAS


Um Mundo de Vidas
de Vergílio Ferreira

Nós vivemos da nossa vida um fragmento tão breve. Não é da vida geral - é da nossa. É em primeiro lugar a restrita porção do que em cada elemento haveria para viver. Porque em cada um desses elementos há a intensidade com o que poderíamos viver, a profundeza, as ramificações.

Nós vivemos à superfície de tudo na parte deslizante, a que é facilidade e fuga. O resto prende-se irremediavelmente ao escuro do esquecimento e distracção. Mas há sobretudo a zona incomensurável dos possíveis que não poderemos viver. Porque em cada instante, a cada opção que fazemos, a cada opção que faz o destino por nós, correspondem as inumeráveis opções que nada para nós poderá fazer.

Um golpe de sorte ou de azar, o acaso de um encontro, de um lance, de uma falência ou benefício fazem-nos eliminar toda uma rede de caminhos para se percorrer um só. Em cada momento há inúmeros possíveis, favoráveis ou desfavoráveis, diante de nós. Mas é um só o que se escolheu ou nos calhou.

Assim durante a vida vão-nos ficando para trás mil soluções que se abandonaram e não poderão jamais fazer parte da nossa vida. Regresso à minha infância e entonteço com as milhentas possibilidades que se me puseram de parte. Regresso à juventude, à idade adulta, ao simples dia de ontem e a infinidade de soluções que não adoptei dava para um mundo de vidas. Foi uma só.

Nela realizei, num único percurso, aquilo que constituiu o todo de uma vida humana. E todavia, nessa estreiteza de ser está o infinito de mim. Deus é a simplicidade absoluta e tem o máximo de ser. Nós conhecemos em nós esse máximo e é por isso que ao Deus o soubemos inventar.

COMENTÁRIO

UM MUNDO DE VIDAS...

“Ao que parece a vida, a nossa vida, a vida de todos nós, isso que eu defino como o espaço temporal que nos coube desfrutar desde que chegámos, não se sabe de onde, até que nos vamos embora , não se sabe para onde, tem sido vivida por nós, muito à superfície, muito ao de leve e é um assunto nada aprofundado.

O mundo em que vivemos ou que nós, indirectamente ajudámos a construir é o mundo dos poderosos, esses que estabelecem os modelos de vivência em comum e nos castigam com palavras ou actos, só porque houve um desvio de rota em determinada altura das nossas vidas. A vida, é um conjunto de comportamentos praticados por cada um de nós , cujo somatório final vem desembocar naquilo a que chamamos de Sociedade.

A sociedade manda nas nossas vidas... , não nos deixa viver e impõe-nos a conduta que defende os interesses superiores. Se isto é assim, por um lado, por outro, não tivemos possibilidades de experimentar tudo, ficámos sempre na dúvida, tantas oportunidades para uma vida só, como diz Virgílio Ferreira.

Tantas hipóteses, tantos caminhos, tantas possibilidades... no fundo, tantas vidas para uma só vida em cada em de nós.”

João Brito Sousa

PS - o estado de direito em que vivemos confere-nos o direito de cidadania e este exerce-se discutindo ideias e não pessoas.