“Mãe Coragem”
Quando, festiva e merecidamente,
completou o centenário (3 janeiro 2013), marco significativo e referenciável de
uma longa dinâmica vida sempre ocorrida em testemunhar os valores cívicos e
morais maiores, chamei-lhe, com toda a probidade e sem que o grande afecto que
nos unia, provocasse indevidos louvores, de “Mãe Coragem”. Lembrei-me então da
peça do mesmo nome, da autoria do dramaturgo Bertold Brecht, na memorável
encenação dessa grande senhora do teatro português, Eunice Munhoz.
É que a ora falecida, em Faro, de que era
uma das mais antigas habitantes, Almerinda Guerreiro de Brito, foi-o sempre uma
outra “Mãe Coragem”, lutando com garra, empenho, dignidade e um comprovado
heroísmo, no seu anonimato, uma irmã gémea da principal figura brechtiana, como
assumiu ao longo de tantas e tantas décadas.
Nascida no bucolismo desse Algarve
verdadeiro, que são as “Hortas” dos Vilarinhos, nos arredores do honrado
concelho de São Brás de Alportel, facto que com muito orgulho e uma veneração
indelével sempre o referia a “Mãe Almerinda”, tempo volvido do casamento, que o
foi de uma vida, com o alentejano, saudoso, benquisto e trabalhador “Tio Pepe”,
tão repentinamente desaparecido do nosso convívio, radicou-se na capital
sulina, nesse bairro do Alto Rodes, outrora uma periferia citadina, que era
residência de quantos procuravam a cidade em busca de um amanhã melhor para si
e para os seus.
E conseguiu-o com aquela determinação,
empenho e espírito de sacrifício, quantos e quantos o realizaram ao longo da
vivência matrimonial, legando “urbi et orbi”, que o mesmo é dizer “à cidade e
ao mundo” uma trilogia de filhos, que são referência comunitária.
O Henrique (presidente do Rotary Clube de
Faro, com serviço permanente à Humanidade – “quem não vive não serve para
viver”), o António (conceituado mestre da arte de mecânica auto e hoje cotado
empresário do ramo automóvel no Canadá, onde se encontra há muitos anos) e o
mais jovem, o Daniel, todos de sobrenomes Brito Figueira (uma referência
respeitosa e respeitável), que foi conceituado funcionário da TAP Air Portugal
e é um dedicado colaborador da Misericórdia de Faro, são a imagem remanescente
deste casal, cuja matriarca, a “Mãe Almerinda”, a proveta idade de 101 anos
deixou na saudosa lembrança de uma das amizades maiores e das mais assinaladas
referências da nossa vida!
“Minha aldeia voltei…” lá estava no mausoléu do poeta sambrazense Bernardo de Passos, no Cemitério de São Brás de
Alportel, onde foi exumada a frase a aguardar esta “Mãe Coragem”, nascida há
mais de um século ali bem perto, nas Hortas doa Vilarinhos e retornada à terra
natal. Na nossa sempre saudosa lembrança o exemplo maior desta algarvia “Mãe
Coragem”!
João
Leal
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