O CRUZAMENTO DA VIÚVA
Este cruzamento situava-se mais ou menos a meio caminho, entre Montepuez e Porto Amélia, (hoje Pemba) no local em que existia a derivação da estrada que ia para Nampula, o distrito era o de Cabo Delgado, em Moçambique.
Apesar da senhora que lhe dera o nome já não ser viúva, uma vez que casara de novo o nome
manteve-se. Era paragem obrigatória da tropa que por lá passava, pela simpatia das pessoas para com os militares e por que sempre havia, ou uma cervejinha ou um petisco.
Decorria o ano de 1963 e apesar dos cuidados, das preocupações e de uma actividade psico social intensa, nada havia de mais grave.
Um dos problemas que era inevitável enfrentar eram as chuvas e as suas consequências, uma vez que o matope (lama) impedia a utilização da estrada e como é obvio a passagem de duas coisas vitais para os soldados, o abastecimento de víveres e o “machibombo” com o correio da família, da(s) namorada(s) e das inúmeras madrinhas de guerra.
A Manutenção Militar estava sediada em Porto Amélia a 220 Km de Montepuez, onde estava instalada a Companhia de Sapadores 315 da qual eu fazia parte. Numa bela manhã de África sai uma coluna comandada pelo alferes Jardim Fernandes, composta por 2 GMC, 1 Unimog e l Jeep onde seguia o alferes e o seu condutor, nas outras viaturas seguiam vários militares cujo número a memória, ou a falta dela, já não me deixa precisar. O objectivo era carregar mantimentos para que fosse efectuado o reabastecimento das tropas.
A viagem decorreu na maior normalidade e o regresso estava a decorrer também sem incidentes. O famoso cruzamento da viúva foi como era costume o local escolhido para a paragem na hora em que o calor mais apertava. Tudo normal até que se ouve um tiro, todos correm para as armas, mas o silêncio voltou.
Um minuto depois chega o marido da viúva com uma arma na mão (era caçador profissional), que diz:- Que coisa estranha, matei um leão aqui a 150 metros de casa, não é normal estes animais andarem aqui tão perto, só se estão com muita fome.
- Mas onde? Perguntou o alferes.
- Vocês vão para Montepuez, não é? Está morto naquele bocado de capim alto, na estrada por onde vão!
Hora do recomeço da viagem, toda a gente ocupa os lugares destinados e a coluna retoma o caminho. Mas “a curiosidade matou o gato” e a ordem para nova paragem no local indicado pelo “marido da viúva” é dada e cumprida.
O primeiro a descer da viatura é o alferes, seguido do condutor, e ainda os outros não tinham esboçado o gesto para sair das viaturas, já um enorme leão estava abraçado ao oficial.
O sangue frio e acredito que também a sorte, levaram a que o alferes colocasse na boca do leão a mão esquerda, e (aqui esteve a sorte) o cano da pistola metralhadora que levava ao ombro, ficasse apontado debaixo da queixada da fera, depois sim, o sangue frio, fez uma rajada com a arma, que essa finalmente, matou o leão.
Na breve luta com a fera esta rasgou-lhe a carne toda do peito, ficando com as costelas à mostra, e a mão esquerda desfeita pelas mandíbulas do simpático animal. Simpático porque poderia ter sido bem pior.
No meio da confusão foi decidido a coluna continuar para Montepuez e o Jeep regressar a Porto Amélia onde havia um hospital melhor e posteriormente encaminhado a Lourenço Marques, depois ainda a Lisboa.
Fui relembrar esta história porque estive há poucos dias na Madeira, para um excelente almoço convívio a convite do meu amigo, António Maria Jardim Fernandes, industrial de hotelaria, proprietário de vários hotéis na Madeira e no Brasil, protagonista de todo este episódio.
Não fico surpreendido se alguém duvidar desta história real, houve familiares de militares, que só acreditaram nestes factos quando ouviram de viva voz o relato feito pelo próprio. O que se repetiu no almoço a pedido claro, deixando os mais novos boquiabertos e os mais velhos saudosos apesar das dificuldades passadas. JÁ LÁ VÃO QUASE 50 ANOS.
Um abraço
António Viegas Palmeiro
Meu caro Palmeiro
ResponderEliminarLembranças da chamada "guerra colonial". Eu também estive na Guiné, já lá vão 47 anos. E também tenho recordações mas que o "acaso" não resultaram em danos pessoais.
Um abraço
Rogério Coelho
Aqui no encontro sapadores 315 na Marinha Grande ligamos a net e com muita sorte vimos esta história .18 de Maio 2013 um forte abraço.
ResponderEliminarDos camaradas da companhia sapadores 315.