segunda-feira, 2 de novembro de 2020

  SÃO MARTINHO LAPA...

        ...vamos ao larapa, São Martinho vinho vamos ao copinho e, a cantilena, prosseguia noite fora pelas ruas da cidade, na véspera do venerado francês, que segundo a lenda fez o milagre da partilha da capa, que criou o Verão fora de tempo.

           Era um alvoroço, naqueles anos 40 do século passado, não obstante a tragédia da II Guerra Mundial, a crise que se vivia e as condicionantes internas e externas, que nos afectavam o pão nosso de cada dia e a liberdade de viver.

           Acontecia ali pelo 10 / 11 de Novembro, quando muitos «iam á adega provar o vinho» e outros, os que podiam, faziam o magusto das castanhas. Nós, meninos e moços de então, ali pelo bairro piscatório da Ribeira, engendrávamos o «São Martinho», armando o andor. Este era constituído por um caixote de sabão «azul e branco», emprestado pelo Sr. José da Avó, que foi um grande «back» do Farense nos tempos da fundação (década 10 do século XX) e tinha, com a esposa, a Dona Ermelinda, uma mercearia daquelas com um livro para os fiados («Vizinho, a minha mãe diz para apontar aí...»). A decoração era feita com as folhas das palmeiras que então enchiam a Avenida da República. A representação humana do invocado um moço de «poucas gorduras para não pesar muito» e que, em regra, pela minha magreza era eu. Pintavam-me na cara, com uma rolha queimada, um curvilíneo bigode, colocavam-se sobre os ombros uma capa da minha avó e, à frente, uma garrafa com pseudo vinho.

           Depois era percorrer a Faro de então, num percurso que se estendia do Largo da Estação, com visita à da Dona «Lózinha», dita de «casa de moças» até ao clássico Aliança, onde negociantes de figo, alfarroba, amêndoa e cortiça, intelectuais e políticos, nos davam os seus óbulos

           Moços daquele tempo que levavam aos ombros infantis ou adolescentes, o «Nita» (Raínha), o Rui, o Rocha, o «Zé Maria» e alguns outros que, nos anos todos de todos os lembrados anos, saíamos com o «São Martinho». Tempos idos...


                                                                JOÃO LEAL


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