O
«FAÍSCA ALFAIATE...»
De
tipo pouco corpóreo, mesmo algo franzino, duas companheiras que o eram de todo
e qualquer instante, a fita métrica para as mediações do humano freguês a quem
se destinava a fatiota nova e o cigarro ou, melhor, a sua reduzida ponta, ao
canto da boca. Enquadrava-se numa clássica janela, tipo guilhotina, num
rés-do-chão da aristocrática Rua de Santo António, «gran via» ou «calle mayor»,
capital que o era e é da cidade maior do Garbe. Por ali o velho e clássico
ferro de engomar a carvão, que os eléctricos ou a vapor ainda estavam por
chegar...
Era
o sr. Faísca, alfaiate, conhecido «mestre tesoura e agulha», filósofo e
conversador, que dava trocos e voltas à malta estudante da década de cinquenta
da centúria ida. Fazia parte de uma classe que, em Faro, teve muitas e
reverentes excelências, alguns com fama por esse Algarve ou, mesmo, Portugal em
fora. Ainda não se adivinhava a invasão do «pronto a vestir» que veio alterar
como um tsunami toda a geologia costeira e o cidadão, com mais ou menos posses,
pagando a pronto («obra pronta, dinheiro na mão») ou a soluços, lá tinha que
encomendar o fato novo ou o fato voltado. O sr. Faísca era um desses artífices,
cotado artista, junto «museológicas» às «manas da Casa Paris» e do «Júlio da
Varina», na banda por onde o meu amigo António Manuel hoje expande parte da sua
metrópole. De quando em quando, no que era pródigo e fiel cumpridor, lá ia até
à famosa Cervejaria Baía, onde hoje é a «Porta de São Pedro», no Largo que o
foi do Bouzela e agora tem o nome do benemérito democrata Dr. João da Silva
Nobre. Nestas idas e vindas do sr. Faísca, que até às tantas da noite, por
entre o chupar da beata e o activar do ferro a carvão, dava sempre tagarela à
malta estudante, haviam uns «amigos malandrotes» que lhe iam colocar, à porta
da alfaiataria, um bocado de papelão com os dizeres; «O Faísca não está...foi
ca.ar». Tropelias de tempos idos...
Mas
queremos aproveitar esta memória para evocar a lembrança de muitos, honrados e
também afamados artistas alfaiates, de que nos lembramos em Faro. Pelos lapsos
cometidos e involuntários as nossas desculpas. Lembramo-nos de: Florival (irmão
do João Silva, na Rua Pinheiro Chagas); Roque (no Terreiro do Bispo, onde
esteve a Nortenha, que era mudo e irmão do médico pediatra Dr. Guerra Roque);
Madeira (pai de um moço do nosso tempo, o Madeira, que era um grande
pingueponguista); Pintassilgo (com ateliers em Faro - Rua Ferreira Neto e
Loulé); Castro (o José João, também de Loulé e um interventor comunitário);
o Valentim (na Rua José Estevão, «Rua dos Ferreiros», que era das Pontes de
Marchil e foi dirigente do Sporting Farense); o «Cádinho» e o pai, na Rua do
Compromisso; o «Máximo de Sousa» (conhecido cantor farense) e os Carvalhos (um
na Rua Infante D. Henrique, a cuja lápide em mármore com o nome Carvalho, nós
os moços da «Rua da carreira» tapávamos o «v»...
Já
na transição para o «pronto a vestir» surgiram alfaiates em conhecidas casas de
moda masculina, como aconteceu, entre outros, nos estabelecimentos dos
conhecidos comerciantes srs. Rodrigues, Robués (Tabú), Lopes e Bernardino
Pereira (Pigalle).
JOÃO
LEAL
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