sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O que a história nos reservou!

De bom ou de mau. Cabe-nos a nós interpretar e quiçá julgar.




1 – Ao longo dos séculos foram várias as tentativas falhadas para constituir a União Ibérica. A criação do Estado português, no séc. XII, tem motivações diversas e eventualmente acidentais. A independência surgiu contra o reino de Leão e fortificou-se na luta com Castela. O tratado de Alcanizes foi o primeiro passo da separação.

Uma geografia montanhosa e agreste, por um lado, e o Oceano Atlântico, por outro, podem justificar a criação geográfica do Estado. Uma economia frágil determinou a expansão ultramarina. Tudo isto nos divorciou da Europa e nos afastou da Espanha. Portugal não era uma nação. Nem disso tinha consciência. Portugal era um conjunto de tribos celtiberas, de visigodos, de romanos e judeus, a que se viriam a juntar, mais tarde, os mouros. Foi claramente por razões de poder entre senhores feudais e de intriga entre as Cortes de Leão e do Condado Portucalense (com a Galiza de permeio) que acaba por surgir Portugal. Tudo o que depois se disse sobre Viriato e os Lusitanos não passa de mistificação setecentista para consolidar uma identidade nacional permanentemente dividida entre Portugal e Castela.

2 – Desde os primeiros reinados portugueses houve sempre a preocupação de fazer contratos nupciais entre Portugal e os reinos de Leão, Aragão e Castela. Os casamentos cruzados começam logo na primeira dinastia e mantêm-se com a dinastia de Avis. Estes casamentos visavam garantir a paz, mas também colocavam questões de sucessão nos reinos envolvidos.
Se exceptuarmos as tentativas de reconquista militar ainda na primeira dinastia, podemos dizer que o Estado português se estabilizou a partir D. Dinis (1261-1325)) e que a partir daí todas as tentativas de “fusão” se devem a questões dinásticas, motivadas pelos referidos casamentos cruzados.

3 – Curioso é notar que com a dinastia de Avis (2ª dinastia) se começa por consolidar a independência (D. João I – 1385), para logo a seguir se tentar a “fusão”, até se perder a independência, após a morte de D. Sebastião. Tudo nesta dinastia. Ora vejamos:

- D. João I – Na sequência da morte do rei D. Fernando, sem herdeiros, a regência foi entregue à mulher, Leonor de Teles. As ambições desta e as inimizades que motivou, mais a sua ligação ao conde galego João Fernandes Andeiro, conspirando para entregar o reino ao rei de Castela (tambem. de seu nome João), criaram um movimento nacionalista, para o qual foi fundamental o apoio da burguesia, com o Mestre da Ordem de Avis, D. João, à frente. Deram-se as batalhas de Aljubarrota e Atoleiros e a independência é garantida, com o apoio fundamental dos ingleses. Em 1386 o Tratado de Windsor, o mais velho tratado internacional do mundo, é celebrado, juntamente com o casamento de D. João com Filipa de Leichester (Lencastre). E nunca mais nos vimos livres dos ingleses.

- D. Afonso V – em 1446, com 14 anos, toma conta do governo que já então se tinha estendido ao norte de África (Ceuta), no reinado do pai, D. Duarte. Afonso V é um rei “fora do seu tempo”: um cruzado e um cavaleiro. Depois de tomar várias praças-fortes em Marrocos, dando expressão à sua faceta de “cruzado”, resolve defender a sua dama e envolver-se numa patética luta com Castela que se viria a ser desastrosa, não fora a intervenção do filho.

- D. João II – filho de Afonso V e desde muito novo associado ao governo de Portugal, foi ele que deu alguma sanidade à gestão do pai e foi o responsável pelo planeamento dos Descobrimentos. O “Príncipe Perfeito” tinha um sonho: ser rei do Mundo! Para isso tinha de conseguir a coroa de Castela. As duas potências ibéricas começavam a descobrir outros continentes e outros caminhos marítimos. Alternativas comerciais e expansão de mercados. Se Portugal e Castela se juntassem, esse novo reino seria o “dono do Mundo”. Esta política de fusão foi deliberadamente conduzida por ele e pelos Reis Católicos. Havia esse desejo por parte de ambas as Casa Reais. Em 1490 casa-se Afonso, herdeiro do trono português, com Isabel, herdeira de Castela. Em breve haveria um único rei na Península. Era a época das “fusões”. Castela tinha já incorporado Leão e estava em “operação de aquisição” com Aragão, fruto do casamento de Fernando de Aragão e Isabel de Castela (os Reis Católicos). Em breve, também, os mouros iriam ser totalmente expulsos, com a tomada de Granada, último bastião do Islão na Península. Não quis, porém, o destino. O príncipe Afonso cai do cavalo em Almeirim e morre sem herdeiros. D. João segundo deixa de sonhar com o Mundo todo e força o Tratado de Tordesilhas (1494), para assegurar meio Mundo.

- D. Manuel I – primo de D. João II sobe ao trono e sem saber ler nem escrever herda tudo o que o antecessor tinha planeado. Por isso é o “Venturoso”. De qualquer forma não desiste do objectivo da “fusão” dos tronos. E, novamente, com o acordo dos Reis Católicos, casa com a mesma Isabel viúva do príncipe Afonso, ela que continua a ser a herdeira do trono de Castela e Aragão. Um verdadeiro “déjà-vu”. Com a mulher em adiantado estado de gravidez, vai a Espanha para jurar a sucessão. Chega a jurar o trono de Castela, em Toledo. A sua garantia era a mulher, Isabel. Mais uma vez o destino não quis. A mulher morre de parto ainda em terras de Espanha e D. Manuel não chega a tomar posse de Aragão. Volta para Portugal com o rabo entre as pernas, mas deixa lá uma semente de união: o filho D. Miguel de la Paz, herdeiro jurado dos três tronos. Era a derradeira esperança de união… Mas não! Também este morre com pouco mais de 2 anos de idade.

- D. Sebastião – mais um homem fora do tempo e, aliás, fora de tudo. Neto de D. João III, inicia o reinado em 1568. Deixa-se matar com 24 anos, em Marrocos, na “Batalha dos Três Reis” (nome dado pelos marroquinos, pois morreram dois reis mouros e um português), na sequência de uma loucura cruzadística. Lança o país na maior confusão dinástica. O quadro sucessório era complexo, mas acabaram por triunfar as razões jurídicas puras e duras. A sucessão competia a Filipe de Espanha. Não houve resistência militar à altura e, com a clara complacência, e até vontade, da alta nobreza e clero, o trono passa para o monarca da Casa de Habsburgo. De 1580 a 1640 Portugal foi mais um país governado por essa “holding” europeia de gestão de reinos. Nunca chegou a haver verdadeira fusão. Nunca houve uma identidade conjunta. Apenas uma gestão conjunta. A independência voltaria por detalhes mesquinhos relacionados com a nobreza e impostos necessários ao esforço de guerra espanhol. Nunca mais haveria outra hipótese…

4 – Na actualidade Portugal e a Espanha estão reunidos na EU. Mas a União Ibérica nunca saiu da nossa cabeça. Uns; para se oporem; outros, para a desejarem. Só isso significa que há uma genética comum. Uma nostalgia de separação.
Quase a totalidade de historiadores e autores que se têm dedicado à nossa história são unanimes na permissa de que sempre houve na mente dos nossos reis, de todas as dinastias o sonho da unificação peninsular.
Um abraço
Diogo

ps
Bibliografia: "o dia de aljubarrota" de Luis Rosa
" Cristovão Colombo agente secreto do rei D. João segundo" de Mascarenhas Barreto
" o ultimo bandeirante" de Pedro Pinto
"D. Sebastião e o vidente" de Deana Barroqueiro
"A esmeralda partida" de Fernando de Campos
" O coraçao do Rei ( D. João quarto) de Iza Salles
" a saga do Rei Menino" de Candido Franco

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Diogo,

Viva.

É um excelente trabalho de investigação.

Não sou especialista na matéria mas que essa vontade de união existiu parece que sim.

Venham mais textos destes. È uma forma de aprendizagem.

Ab,
JBS

Anónimo disse...

Caro Diogo:
Gostei do teu texto.
A História fascina-me,porque acho que é conveniente(perfiro ao bom), sabermos de onde viemos , o que fomos , o que somos , para onde queríamos ir, e para onde estamos indo.
Li num poema de Leopold Senghor, poeta e primeiro presidente da República do Senegal, depois da Independência: Je ne peut pas oublier ma goute du sang Portugais.
E era um negro africano.Poeta da Negritude.
Como poderei eu esquecer a minha gota de sangue árabe, ou castelhano ,sei lá...dos meus antepassados do Al Andaluss.
Sei Lá...
Fizeste bem em acordar os Espíritos.

Grande abraço.

J. Elias Moreno