terça-feira, 23 de novembro de 2010


REMEXIDO


A primeira vez que ouvi falar do REMEXIDO foi por volta dos meus 12 anos, num dia de Inverno em que o mau tempo não deixava os homens ir para a faina marítima. Existia vários contadores de Histórias e um dos mais eruditos foi meu Tio Avô (Irmão do meu avô) no seu moinho na Praia dos Estudantes de nome Manuel Lázaro.

Depois de falarem do filme do José do Telhado que há anos vinha sendo exibido nos cinemas onde baralhavam com um pseudo filme rodado no Algarve em que tinha participado o Miguel Cego da Alcaria Cova o que nunca confirmei, entrou na conversa o Remexido, assim como as guerrilhas para expulsão dos Franceses na últimas das Invasões.

Era um entretenimento numa época em que não existia TV. Nem net , o Rádio poucos tinham e a maior parte das notícias vinha nos Jornais em que conheci várias famílias que não perdiam o Século que saía na Sexta-Feira e chegava á cidade no comboio rápido da tarde (ideais republicanos).
As Histórias no meio até essa época eram transmitidas oralmente de Pais para filhos , muito dos acontecimentos se misturavam como aconteceu com o caso do Remexido que nada tem a ver com as guerrilhas contra os Franceses e sim pela causa absolutista do rei D. Miguel, nem pertenceu ao bando do Zé do telhado.

Século dezanove em que proliferou as Revoluções em Portugal , só me recordo da matéria escolar fazer destaque á Maria da Fonte, enquanto nomes como João Brandão e Zé do Telhado , só mais tarde é que tomei conhecimento e nenhum deles era do Algarve e temos assim:
um Herói Algarvio, Herói Português!

Camilo Castelo Branco captou-o como personagem, que em 1836 dirigiu uma forte guerrilha em S. Bartolomeu de Messines, mas prolongou-se por todo o Algarve e Alentejo, embora o Sotavento Algarvio tenha sido mais poupado, com excepção do Azinhal.
Pensa-se, que por ser uma zona mais pobre de recursos alimentares e de posses dos habitantes da serra Monte Figo, mais aberta, sem arvoredo e de fácil acesso à linha bem protegida por tropa de Castro Marim, Tavira, Faro e do Batalhão de Voluntários de Olhão. Também poderia não actuar por esta paragens, por haver um batalhão de voluntários realistas em Tavira, que foram favoráveis, quando o governador do Algarve, era Sebastião Martins Mestre, ao serviço de D.Miguel.
Seu nome José Joaquim de Souza Reis, foi uma personalidade natural do Algarve, que granjeou certo prestígio na área das milícias populares e nasceu por volta do início do século XIX em Estombar, filho de lavradores abastados que faleceram ambos com poucos meses de intervalo, quando ele tinha apenas 6 anos de idade. O rapaz foi, então, entregue aos cuidados do seu tio José Joaquim de Souza, prior de Alcantarilha, que o destinou à vida sacerdotal, colocando-o no seminário de Faro aos 14 anos e recomendou – o ao bispo do Algarve, que era então o insigne D. Francisco Gomes de Avelar.

Casou-se em S. Bartolomeu de Messines. Deve-se, aliás, ao seu casamento , o nome por que ficou conhecido, já que se rebelou (remexeu) contra o seu tutor, que lhe proibia o casamento. Era um homem de posses, capitão de ordenanças, além de exercer a função de recebedor do concelho. Servindo D. Miguel, derrotou, em conjunto com o general Tomás Cabreira, o famoso Sá da Bandeira, na batalha de Sant' Ana. Estava-se na época da guerra civil, entre liberais e miguelistas.
Quando o primeiro duque da Terceira tomou conta do Algarve, o Remechido escondeu-se na serra algarvia, onde, recorrendo a uma táctica de guerrilha e apoiado por serranos, venceu sistematicamente as tropas governamentais. Diversos crimes foram cometidos em seu nome e rapidamente se tornou uma lenda de temor que se espalhou até ao Alentejo. Contudo, estudos recentes parecem ilibá-lo de tais crimes e acções ignominiosas.
De facto, queimaram-lhe a casa, açoitaram-lhe publicamente a mulher por não revelar onde ele se encontrava escondido e, por fim, mataram-lhe um filho de 14 anos.

Revoltado contra tal crueldade,vingou-se como podia e jamais se entregou, mantendo a sua acção de guerrilha mesmo depois da Convenção de Evoramonte.
Procurava castigar os que os perseguiam, mas perdoava aos soldados que lhe caíam nas mãos, porque desempenhavam um serviço que eram obrigados a fazer.
Por fim, foi capturado, levado a Conselho de Guerra e fuzilado em Faro. Julgado por um Conselho pouco simpatizante da "causa miguelista", e mesmo tendo-lhe a rainha D. Maria II concedido o perdão, tal ordem não foi cumprida e fuzilaram-no por interesses políticos e pessoais.

O Remechido (ou Remexido) é talvez a última personagem romântica do Algarve, um guerrilheiro contra-revolucionário que viveu e morreu pela causa absolutista e anti-liberal. Um exemplo de sacrifício e perseverança que deve servir de exemplo aos jovens revolucionários inconformistas que escolheram a via da dissidência para combater o actual estado de decadência em que está mergulhado o nosso país.

Com apoio de pesquisas na net.

Saudações Costeletas
António Encarnação




3 comentários:

Associação Antigos Alunos Escola Tomás Cabreira disse...

Meu caro Encarnação.
Era eu moço e o meu avò materno que tinha a casa e o monte no serro do Malhão, entre Boliqueime e Paderne,falava-me do Remexido que chagou a ter o seu "exército " de guerrilheiros acoitado no serro do Malhão. Li o livro "o Remexido", não me recordo do seu autor, no Circulo Cultural do Algarve. Segundo o livro, viveu algum tempo no seminário de Faro e, valendo-se de uma corda, descia pela janela e aventurava.se pela cidade de Faro. Uma noite ao regressar e entrar pela janela deu de caras com o Bispo que o esperava sentado em frente da janela. O alcunha de "remexido" deve-se ao facto, segundo o livro, de no regresso das suas idas a Lisboa contar que "remexi aqui, remexi ali".
Recordei o livro que tinha lido com muita satisfação e curiosidade.
Rogério

Anónimo disse...

Ao ANTÓNIO ENCARBAÇÃO.

Viva.

Antes de mais dizer-te que o texto é sempre oportuno.

Duas coisas:

Do que eu sei, a história do Remexido está toda na obra de CAMILO CASTELO BRANCO, a Brasileira de Prazins, e

A entrada do Remexido nas lutas liberais, teve origem quando um dos elementos de D.Pedro, saiu do cerco do Porto e veio até ao Algarve para se dirigir a Lisboa à procura de reforços, o que não aconteceu porque lhe apareceu pela frente o Remexido.

Ab.
JBS

amigalete disse...

Eu nasci na serra do Caldeirão e o meu pai era da Califórnia, lá bem na serra. Toda a minha vida ouvi chamar ao meu pai e família os "Guerrilhas". Será que sou descendente do Remexido?