terça-feira, 21 de junho de 2011


VINTE ANOS DEPOIS

Por João Brito Sousa

É o meu Albino que está a chegar da América... ai ... ai ...ai, é o meu Albino, ó meu filho, há tanto tempo meu filho, ó Adília... olha o Albino, ó Irene, ó ti Bento é o meu filho, o meu filho, o meu filho...gritava a velha.
Foi no Verão de 49/ 50, que a velha Teresa Guerreiro apareceu na estrada, lá nas Areias, saindo de casa onde estava encostada à ombreira da porta, para vir abraçar o filho que estava a chegar da América, depois de lá ter estado longo tempo.
Vinha agora à terra.
Antoninho que ia para a escola, ficou assustado ao ouvir toda aquela gritaria, mas veio a compreender, mais tarde, que aquela mãe, tinha dentro de si uma dor à espera de conforto e, gritando e vendo o filho ali à mão, tinha atingido o ponto máximo da razão de ser mãe e também de viver, consubstanciado na chegada do filho, que sempre ansiou. Ou seja, naquele momento, toda ela estava ali disponível e por inteiro para o filho, o seu sangue e o seu corpo, continha em si todo o amor de mãe, que se expressava naquele grito. Digamos que já podia morrer.
O pai, o ti João Guerreiro que andava nas regas na horta, apareceu depois, já os ambientes tinham serenado, mas ainda deu uma chorada, quando se abraçou ao filho, dizendo, lá do alto da sua competência de lavrador bem sucedido na vida e de homem de valor e honra:- “meu filho, um homem também chora”. E chamou de seguida o Ti Manel Bento da adega, para que visse bem quem ali estava... e baixando o tom de voz , disse:
Manuel Bento, meu velho amigo e inimigo também, a tua adega tem condições para receber este homem, o meu filho, agora aqui chegado?... para ficar, ouviste ó Albino .. e dizia-lhe isto de cenho cerrado enquanto o olhava nos olhos, levando nas suas palavras uma mensagem de força e confiança no destino. Agora é aqui meu filho. e tens ai uma fortuna à tua espera, ouviste Albino? E tu ó Manel, o que é que dizes acerca da adega para se tomar lá do teu belo vinho?
O Ti Manuel Bento, que tinha a mania da tropa e de se armar em capitão, logo disse, ok meu comandante de enxada, ao mesmo tempo que dava instruções à Irenezinha, para que fosse dar uma limpeza na casa, pois o primeiro copo tinha de ser na sua adega, como pediu o Ti João e ele fazia questão disso.
- Dá cá um abraço ó Albino, foste daqui um gaiato e vens de lá um homem. Vê lá tu como as coisas são. E as americanas ó Albino, tal é o material. Tanto que eu gostava de ter ido para aquelas terras do dinheiro, mas não pôde ser.
- Pai, ó Pai, era a Irenezinha que vinha dizer que a coisa estava montada, que podiam ir até à adega, que a mãe, a Ti Benta, já tinha a coisa em condições .
E lá foram todos beber do vinho do Manuel Bento, na mesa que Rita Bento, a esposa, preparou para o evento.

(retirado do meu romance NAS MARGENS DA VIDA)

jbritosousa@sapo.pt

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